ANGUSTIA MESTRE

 

 

Todos os dias para mim são agora esta angustia mestre. Todas as noites são a ampliação do mesmo. Sou atingido pelas  vibrações poderosas, que me roubam o sono ao invadirem-me o íntimo de sensações que me transcendem e enlouquecem. Segundo as interpretações celestiais, é a sequência mais elevada de todas: construtiva na iluminação, destrutiva na frustração. As palavras esboçam uma assombração iminente se mal interpretadas. Há quem chame insônia à ausência de verdades, mas é esta intuição sem nome que me atormenta as verdades... E esta culpa metabólica de não conseguir encontrar o caminho definitivo para resolvelas. Abasteço-me abundantemente de livros que não leio, de músicas que não ouço, para ocultar a miséria sofrida de parte da minha vida. Flutuo entre muros e tetos, sem chão e sem abrigo, sem descanso, pelo claustro voluntário em que mergulhei, à espera da aurora que não chega. Agarro-me à dormência das extremidades latejantes do meu cérebro, à procura de um qualquer desmaio, mas não adianta. Não me consolo. Estou aqui, na companhia de um maço de cigarros que se acaba. Nada sei a não ser do que preciso neste vazio que engulo aos solavancos: a anestesia volátil do álcool que não ingiro. Os soníferos que não consumo. Sento-me e debruço-me sobre as palavras salgadas que fluem em dilúvio. Não me lamento das contrações que me percorrem os músculos, nem dos soluços em que me engasgo. Não há queixume no isolamento do mundo a que me sujeito, consciente de mim. Forcei-me a adaptá-lo, quando tantas vezes me foi imposto. Fatídico como um cancro que se conhece, não como um súbito acidente qualquer. Igualmente insuportável, mas de mais fácil aceitação. Não existe assim o choque frontal com o espanto e o horror. Existe sim o desalento mórbido, a hora demorada e umedecida, a tortura ora lânguida ora desesperada, o dia que se repete sucessivamente na esperança do tão milagre de encontrar verdades. De estar em paz comigo mesmo. De amar a simplicidade de meu eu... Continuar a seguir caminhos corretos, afastar espinhos para outros não se machucarem, quebrar as pedras para que sejam caminhos ultrapassáveis... Acreditar e ser acreditado.