Torrencial
As horas me invadem com tanta precisão...
Evadem as urgências do meu coração...
Despem-se os minutos inexatos de cada hora duvidosa.
Minh'alma tem sede e paradoxalmente se derrama chorosa.
Uma falta de tudo, de nada, de mim... saudade sem nome...
Pego as vestes da fé emprestada, a fim de intimidar a morbidez e fragilidade; minha face tristonha se esconde.
Calço as sandálias da coragem, mas meus pés dançam num espaço desproporcional...
Em doses homeopáticas, me alimento das goteiras do meu telhado ocular; no entanto, meu esforço é frugal.
O tédio se assoma; com tenebroso olhar tenta derrubar-me... mas já estou exaurida e lançada ao chão. Caminho pelas minhas beiradas, temendo cair em abismo.
A atmosfera melancólica corrói as engrenagens do meu coração. Estou presa nesse cataclismo.
Respiro lento e calmo... um clamor, um berro, um sussurro, um afago!
Decodifico minhas batidas insinuantes... é tudo latejante...me espanto com o ritmo sinusal.
De onde advém minhas inquietações?
Meu corpo parece desabitado.
Ecoa um chamado vindo das minhas profundezas. Meu espírito se encontra surdo e enlutado.
Não demora, caio em queda livre para dentro de mim... batem em retirada todas as vis incertezas... me apalpo, me sinto, me acaricio... ainda estou inteira!
Desvanece essa tempestade incauta e passageira... em hora derradeira.
Cogito abrigar-me... dar um ultimato a esse instinto nômade.
Uma trégua momentânea e formidável, enfim!... oscilante, eu sei... porém, nada disso decreta meu fim.
O leito do rio tem calmaria, no percurso, inúmeros obstáculos... quanta ousadia!... as margens o comprimem... calma!... não o subestime!... lá na frente suas águas estarão virulentas, sedentas por repouso, em uma nova nascente, numa intrépida torrente...... inevitável conter seu transbordo... retornando a mim, estou assim: passando... mesmo que em passos lentos... estou (só) no meio.