Mãe, minha dor maior
O que estou sentindo neste exato momento? Esse simples, mas profundo questionamento é o que me leva a escrever. Buscando palavras, conforto, consolo, num verbo ou num ponto final. De agora em diante, escrevo essa mensagem que talvez nunca nem seja lida por essa pessoa que faz meu coração acelerar no pior dos sentidos.
Mãe: Veronica, 52 anos, solteira e mãe de três filhos (Dieux, 26, Isis, 24, e Lohan, 12). O que mais me incomoda é ver como a senhora se vitimiza e se sente a pessoa mais infeliz do mundo, achando que todos devem viver em função das suas necessidades. Dói ver como a senhora não tem amor próprio e que aceitou ser agredida física e psicologicamente pelo marido e pelo filho mais velho, ainda sendo capaz de perdoar esses dois e me ferir tão fundo. Você disse que eu era infantil e imatura por não saber perdoar as pessoas. Mas quem disse que eu sou obrigada a perdoar? Eles me feriram e te feriram, mas eu que sou a vilã da história, não é? Eu, que tanto me esforcei em vão para ser a filha exemplar, que desde os 12 anos aprendi a cuidar de um bebê, aprendi a cozinhar, e a ter responsabilidades que não cabiam a uma criança. Além de estudar mantendo o mesmo nível de bom aprendizado na escola.
Com isso, eu só ganhei traumas e um sentimento de obrigação de agradar as pessoas, sem aprender a dizer "não". Sabe o que doeu mais? Doeu quando você disse que era minha culpa que estavam te ameaçando por eu ter feito a denúncia de que sofri abuso sexual e tentativa de estupro. Se não fosse por minha causa, aquelas pessoas não estariam indo até a sua casa depois de 13 anos do incidente, não é? Eu só tinha oito anos. No dia seguinte ao ter dito isso, você só me disse que eu não deveria escutar tudo o que você fala, pois "é da boca pra fora". Mas essa desculpa eu não aceito mais! Todas as vezes que você me diz "eu te amo", eu sinto uma dor imensa por não poder dizer o mesmo de volta. É um sentimento que eu não consigo mais forçar e perece em mim. Até mesmo quando eu disse que fui aprovada no doutorado para estudar na Alemanha... Lembra como você não me abraçou naquele dia? Eu lembro. E depois disse que eu não amava o Lohan, pois eu iria embora e daria um pé na bunda de vocês. Agora eu vejo melhor toda a situação. Era manipulação. Você queria ser sustentada e aquela menina que te via como um Porto Seguro e deixava você roubar o dinheiro que ficava na mochila agora tinha crescido na terapia que você sempre foi contra. "Isso é coisa de doido", era o que eu sempre ouvia.
Até o meu casamento foi um momento que lhe trouxe incômodo. Saiu antes do fim para ficar lá fora comendo um salgado na mercearia em frente ao cartório e não voltou mais. Disse que eu não lhe dei atenção e que eu só me importava com a família do Otávio. Abrindo aspas bem grandes aqui para lembrar que você nem queria ir ao casamento e depois mudou de ideia no dia anterior. Eu já não tenho saúde mental para lidar com uma pessoa narcisista e que agora me liga o tempo todo do Brasil para mostrar para os outros que sua filha está morando fora do país. Mais uma vez, posando de boa mãe. Só não esquece de falar da parte dos milhões de problemas e como está sem geladeira e continua sem trabalhar há 10 anos. Ou de quando vendeu quase tudo dentro de casa, incluindo meu absorvente, brinquedos do Lohan e até comida que ganhamos de doação do centro espírita. Eu já não te conhecia mais.
Meu maior medo é que o meu maninho realmente me veja como egoísta e sinta que eu o abandonei. Eu só estou dando duro pra caramba pra ter uma vida melhor. Mas dói tanto sentir isso. E morar fora é cheio de saudades e descobertas. Tem dias que não tem a luz do sol e a gente sente que não vai levantar, mesmo quando é preciso. Às vezes, a gente sente falta do carinho de amigos que nos conhecem desde sei lá quando. Falta da comida do nordeste, do sol na pele, do cheiro do mar, da areia da praia, da cachoeira de Ubajara. A vida continua e a cada amanhecer eu tento ir mais longe e me ver crescer. Esse texto é um desabafo de um sentimento que eu precisava me livrar. Não consigo escrever mais depois disso. Preciso de água e um suspiro profundo. Um suspiro para voltar ao mundo da matéria e dizer adeus ao mundo da palavra. E sim, eu adoraria que esse texto fosse fruto da minha imaginação, mas não.