O Mito da Grande Pérola ...
Houve um dia, um dia de crepusculares tempestades, uma angustiante lamúria a desvelar mistérios soprou as trevas da indiferença através dos vales, das flores nuas e do marulhar das ervas imemoriais; o céu abriu-se como um olhar de plumas de pavão, abandonado desde o firmamento a uma antiga promessa de lágrimas.
Mas não se ouviam ainda os filhos da noite uivante, nem os rumores mortais, nem o cântico dos suicidas ou as lamentações do profeta temeroso, o abismo era noite dos homens, tudo o que havia era o silêncio.
Foi quando um deus de íris cadentes quedou-se atraído pelo desconhecido brilho vindo das águas profundas e perdendo-se assim nos horizontes da terra desabitada, chorou; então, em luto apaixonado e rompendo o eterno silêncio de suas solidões imortais as filhas da alva rogaram ao abismo, o possuidor do "trovão vermelho":
"Dá-nos a pérola primordial que luze pálida na escuridão de suas águas para que perseguindo-na às margens do infinito o deus caído tome de volta o caminho que conduz à vida!"
Como nem toda a fúria estrelada dos clamores das filhas da alva alinhada ao frágil suspiro das flores puderam tocar a noite, o abismo conservou-se: um perpétuo imperturbável; dele ( a quem tudo devora ) nenhuma existência jamais ousara aproximar-se, tão ameaçadoras as sombras de sua treva.
E assim o tempo soou, uma vez mais, descontínuo...
É dito que uma única estrela ousara aproximar-se do abismo, e que em um congelante abraço apressara seus raios em direção ao mar: são eles a grinalda de louros que cingem hoje a lua, a pérola primordial.
Foi por isso que, os deuses, cuidando temer a morte iminente velada nos anseios do tempo esconderam-se nos rincões do universo: o silêncio fora afrontado pelos mortais, filhos do Sol, deste por quem as filhas da alva traçam nos céus sua senda de eternas vigílias.