[O Meu Tempo: A Viagem]

[Palimpsestando-me...]

Quando vi a luz primeira sobre a Grande Avenida,

eu soube: não há outro — este é o meu tempo!

Para abater-me o orgulho da Ciência,

para pranchar-me na cara o meu Nada,

para mostrar-me a derrocada da minha Construção,

o meu tempo afasta-me das coisas —

com sua fluída mão inexorável,

arrancou-me da minha terra,

e lançou-me longe, bem longe de minhas raízes...

Constantemente, o tempo retira-me da vida,

retira-me das águas claras, varadas de luz,

junta, funde a minh'alma no escuro da noite,

e dissolve-a no dorso sombrio do grande rio;

afasta-me das ruas da minha infância,

afasta-me do entusiasmo da mocidade,

afasta-me dos ideais que tive,

afasta-me do ânimo, da vontade de viver

e aniquila a possibilidade do futuro!

Em breve, quebrará as minhas pernas,

escurecerá as minhas vistas,

e já não irei a parte alguma;

e até mesmo as flores do meu funeral,

conspurcadas pela minha sânie,

também me serão retiradas, mortas!

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[Penas do Desterro, 23 de dezembro de 2007]