[O "Valor de Face" da Palavra]

Pensar em analogias descabidas pode ser apenas um exercício de imaginar possibilidades impossíveis, ou, de fabular inutilidades. Um exemplo disto é a junção destas duas palavras, "possibilidade impossível". Ainda assim, este tipo de pensamento freqüenta o horizonte dos olhos da imaginação... fabula inutilidades, futilidades... será?

Incluo nesse interminável rol de futilidades a comparação entre a Moeda e a Palavra: a Moeda tem seu valor, o "valor de face", por assim dizer. Se não há mais o padrão-ouro como lastro da Moeda, por que mecanismo conseguimos fazer as trocas? Há uma comunicação de confiança... e essa comunicação se dá pelo "mecanismo de preços", e este, quando sem os ruídos da inflação, é altamente eficiente, faz parte da própria vida! Este mecanismo faz com que uma dúzia de ovos tenha preços muito semelhantes em partes distintas do país, sem que ninguém assim determine. A mais não me arrisco, não sou economista!

Mas e a Palavra — terá um "valor de face"? Vale pelo que é? Vale "quanto pesa"? Vale pelo sentido que o outro faz dela? Confiança pode ser comunicada pela Palavra? Qual é o [latente] mecanismo de comunicação de confiança? E o "lastro", que "lastro" tem a Palavra? E quando, por mais clara que seja, a Palavra não expressa o que realmente sentimos, o que realmente queremos dizer? Por exemplo, quando sob efeito de drogas, álcool, ofendemos alguém... haverá lastro nesta Palavra? Ou outro, tocado pelo "valor de face, crê que sim, e por isto mesmo, se sente ofendido. Será isto o "valor de face" da Palavra: o valor que tem para o outro, mas talvez não para quem a emitiu? Parece-me que sim...

A Palavra rompe a barreira dos dentes e voa solta; mas só os milênios a farão voar para o esquecimento. Mas antes deste destino se cumprir, carregará consigo o terrível "valor de face" que, diferente daquele da Moeda, não pode ser rasgado ou incinerado, e para nosso horror, nem modificado! Uma vez cravado, ou melhor, gravado na mente do outro, nem a Morte consegue apagar: o "valor de face" da palavra atravessa gerações e gerações, explodindo em ódios atávicos. Levando a analogia um pouco mais longe, nem mesmo há o "ruído", a "estática" da Inflação para "depreciar" ou melhor, diminuir o poder do "valor de face" da Palavra!

Para sempre, queimará num inferno irremissível o emitente de tal "valor de face"...

Vou agora clicar em "publicar" antes que eu me arrependa, vou deixar mais esta fútil, inútil analogia romper a barreira dos... ah, sim, dos dedos que estavam a teclar! Quebro o elo de silêncio entre minha mente e minhas mãos... lá vai...

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[Penas do Desterro, 17 de dezembro de 2007]