O DISCURSO DA COLINA (prosa poética)

Quem está cansado pede por descanso. As pernas e o tronco, a mente e os seus sentimentos; imploram. Deita-se na colina sentindo a areia quente do deserto, no dia mais escaldante da viagem. Aproveitando-se do intervalo para todos comerem, ele procura descansar enquanto os companheiros Pedra e Viril procuram alimentar uma multidão que não para de aumentar.

Deitado, o jovem observa o céu límpido sem nuvem carregada de uma chuva que viria a calhar, refrescando a todos. Ela, amenizaria e acalmaria, também, os seus pensamentos petulantes que insistem em desviá-lo da sina, dos seus objetivos que é: falar, falar, falar até que compreendam a necessidade de mudarem a si próprios. Se mudarem; mudarão o mundo.

Os outros estão extenuados e descansam aqui e acolá, longe dos seus olhos: O Gêmeo, o Zelote, e os Filhos do Trovão que permanecem ativos nas tarefas, mas os demais parecem decepcionados, pois o viram como um revolucionário que pegaria em espadas provocando iras nos inimigos poderosos. Enganaram-se: As suas armas são sábias palavras, amor incondicional e a Verdade.

É chamado:

— Nada encontramos. O que devemos fazer? foram as palavras que interromperam a sua linha de pensamento...

Senta-se, e olhando aos companheiros diz com aspereza:

— Sempre existe o que comer. Sempre existirá o que dar de comer e a quem dar. Procurem direito, impôs com autoridade e eles, desanimados, misturaram-se com a multidão, novamente.

Deita-se mais uma vez. Agora, está inquieto... Remói-se pelas palavras duras com os companheiros. Afinal a sina, as obrigações, são-lhe destino e longe pode ter a petulância de exigir deles um fardo maior. Dói-lhe saber intuitivamente, divinamente, que suas palavras serão pouco compreendidas, respeitadas ou seguidas. A beleza do seu trabalho poderá atravessar séculos ou se perpetuar pela eternidade, porém muitos o ofenderão ou gritarão pelos quatro cantos o seu nome almejando benefícios próprios, pisoteando sem dó os puros, roubando valores, criando em seu nome; igrejas. Serão discípulos esquecendo que nem o Maior criou para si templos e doutrinas. Esquecerão que ele tentou ensinar a amar e não seguir uma religião: A simplesmente praticar a essência da religiosidade de amor ao próximo.

Seus pensamentos novamente são interrompidos:

— Nada encontramos. Eles precisam por si mesmos encontrarem o que comer.

Levanta-se. Inspira paciência e expira compreensão. O jovem de pele morena curtida pelo sol desde que nasceu, com a sua roupa e cabelos encaracolados necessitando de lavagem, desejando uma urgente boa-noite ao sono, confirma que eles possuem pouca fé, lembrando-os de bastar uma porção do tamanho da semente de mostarda para realizar um milagre. Porém, repreende-se. Alenta-se que a missão é só sua. Olha nos cestos a pouca comida conseguida que é o resultado daqueles que tem muito a aprender no verdadeiro caminho da Verdade e...

— Jesus, eleva o olhar ao Céu, pede fervorosamente ajuda, abençoa a necessidade de todos e os cestos transbordam-se de pães e peixes.

Enquanto, começam a se alimentarem, deita-se decidido que pedirá ao Pai pela chuva, sabedor que aquele que pede com fé: recebe.

Nesse momento chega o discípulo preocupado com as finanças do grupo e se deita ao seu lado. Também está cansado. Olha ao Mestre dizendo-lhe:

— Saiba que há dias atormento-me com a chegada da hora. Não vou desistir! Mas, confesso-lhe que tenho arrependimento por ter concordado...

Jesus, respira profundamente, respondendo-lhe:

— Nada de preocupações antes da hora! Ainda está longe de acontecer.

— Estou preocupado. Não tenho conseguido dormir.

O jovem com calma e paciência:

— Eu tenho, também, as minhas preocupações. Lembre-se que tudo tem o seu propósito e tempo necessário. Faremos o que tem que ser feito e tudo se cumprirá. Querido, amigo! simplesmente, deixe ao futuro as preocupações do próprio futuro, pois muito faremos juntos. Procure descansar enquanto a multidão alimenta-se e não se preocupe, querido Judas! pois eis que até no seu beijo uma grande lição à humanidade ecoará pela eternidade. Acredite em mim, pois não são palavras minhas, mas Daquele que tudo entende e tudo sabe.

Outra vez de olho no azul-céu iluminado, inspira paciência e expira compreensão, pegando no cochilo, chegando a roncar. Sente-se em paz, sendo a própria paz.

Arabutã Campos
Enviado por Arabutã Campos em 15/06/2023
Código do texto: T7814194
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