COISAS DA VIDA
A convivência entre casais que vivem juntos sob o mesmo teto nem sem sempre é parecida com o que se lê ou que se ouve das narrativas dos contos de fadas. Querendo ou não, uma vez ou outra, há discórdias e desentendimentos entre os envolvidos que tendem a jogar tudo para o alto ou não.
Há membros de casais que são useiros e vezeiros em chantagear um ao outro e assim vão levando a vida até o dia em que um deles parte para o tudo ou nada, indo embora de uma vez por todas ou continuam praticando chantagens as mais absurdas e imagináveis enquanto permanecem juntos.
Zé Velho, um homem do campo que mora nas adjacências de Cafundós de Judas, é uma dessas pessoas que de vez em quando consegue reservar um tempo para chantagear a companheira dele, mas ela já conhece de fio a pavio as peripécias praticadas por ele e não o leva muito a sério.
Numa convivência de quase meio século, era comum o casal brigar em pelo menos uma vez por semana, geralmente por motivos banais, mas na manhã seguinte, após uma conversa um pouco mais séria, tudo voltava a ficar meio parecido como era antes.
O tempo foi passando naturalmente e entre uma chantagem e outra por parte dele ela ia contornando algumas situações que em princípio pareciam insustentáveis para a continuidade da vida do casal, até que certo dia a situação ficou fora de controle e Zé Velho jurou tirar a própria vida.
Com ar de quem estava desnorteado e muito nervoso, ele apanhou uma corda de sisal e uma enxada e saiu dali dizendo que sua vida a dois não teria mais sentido e que sua esposa aguardasse notícias dele a qualquer momento.
Com receio que ele fosse realmente acabar com a própria vida, algum tempo depois ela decidiu procurá-lo e o encontrou deitado no meio da plantação do casal, com uma ramagem de melancia envolta ao pescoço, numa posição de alguém que tinha tentado morrer enforcado e pensando em retirá-lo dali o mais rápido possível, ela gritou em alto e bom som:
- Zé Velho, pare de me chantagear. É com uma corda bem forte que se faz isso e não com uma ramagem de melancia como essa que você usou e o levantou do solo em seguida, sendo que o companheiro dela que àquela altura dos acontecimentos estava muito envergonhado com o acontecido, sem perda de tempo respondeu:
- Eu já usei minha corda de sisal a qual ainda está presa naquela árvore frondosa que fica logo ali adiante, mas ao tentar apertar o nó no meu pescoço senti uma falta de ar fora do normal, por isso decidi voltar para cá, me deitar neste solo, e usar essa ramagem de melancia para cumprir em definitivo com meu intento.
Ela riu um pouco, o abraçou fortemente e se reconciliaram em seguida. Viveram felizes para sempre, mesmo que de vez em quando ele continuasse fazendo chantagens e/ou brigando por motivos banais.