BEBENDO AS HORAS
Enquanto a tarde passa, eu passo o tempo.
Contemplo a vida através de um copo. A branca espuma, o ouro.
Vejo as ondas acariciando a areia, o sol poente. Devaneio. O copo cheio – vazio – cheio.
Bebo as horas, os minutos. Trago os segundos. Na sombra da mente, sorvo lembranças.
Penso... Penso? Pensamento, sentimento, mente.
Anoitece — a noite tece estrelas e luas, descrevendo círculos no meu céu distante.
Instante verdade: vontade, vaidade, anseio — felicidade!
Vago sem rumo, sem prumo. Distraio, traio, subtraio — efemeridade!
A filosofia é minha arte!
Meus pés perseguem os meus passos. Já, a noite desmaia. Canto, encanto, desencanto.
A bruma se esvai. Ofuscante aurora fere-me os olhos... Opa!
— Apaguem a luz!
Estou só, no mar de areia. A lua se escondeu e nem era cheia!
Levou consigo o colar de estrelas. Belas, belas...
Ouço as ondas — ressaca — vejo a maré quebrando-se nas rochas, o sol nascente, a branca espuma, o ouro.
Minha utopia traça um dia sem memória do que ontem eu era e do que sou agora.
Agora, sem alarde, aonde vou, já vou tarde! Ou será que ainda é cedo?
Imagem: Arraial D'ajuda (Zaira Belintani)