O navio bombardeado
Pensando Jesus, Kardec, Durkheim, Marx, Sartre e Victor Hugo.
— Irei vender limão na feira.
Se decidiu Jacó Trindade,
Queria gerir sua liberdade:
Na lista, a pauta primeira.
Queria a plena autonomia,
Ser senhor de seu horário,
Definir próprio salário
Para a carência de seu dia.
Jamais vendeu seu capital,
A sua força de trabalhador,
Por bagatela, ao comprador,
Salário mínimo um mensal…
O seu patrão foi dispensado,
Que de si mesmo já o era,
Sem ilusão medo ou quimera,
À vaga aberta, ei-lo empregado.
Muita risota, era o que ouvia:
— “O bobo por haver trocado
“Conforto de ser contratado
“Lá muito mais se ganharia!”
Jacó de si tudo aceitou
Sem mudar a opinião
Com seu produto seu limão
Consigo em paz continuou.
Não lhe faltavam o desjejum
Nem a carne o arroz feijão
Fazia a terceira refeição,
Tinha com que soltar o pum.
Não era a bens, seu prisioneiro,
Lhe havia a feira em plantação,
De milho couve ainda o limão
Qual filho único único herdeiro.
Não era herdade mundão mundéu,
Uma imensidão de acre em terras,
Nem rei nem duque da Inglaterra:
Com uma vaca ao leite, o cão Fidel.
Final de feira a baixo preço
Todo o produto poderia
Aos pobres dava, não vendia
Aos montes, dignos de apreço.
Que a sua alma lapidava
Na Caridade um desprendido,
Era-lhe o bem o lucro havido,
Do que feliz se contentava...
Nos olhos, pouco, desejava,
Evitando o consumismo
E firme nesse realismo
O tempo célere voava...
Mas teve que deixar a terra
Em que nasceu homem nasceu
Uns trinta e poucos, pouco viveu
Por seu país ter ido à guerra…