Enquanto Isso

No silêncio da madrugada, o pensamento, na lentidão das horas, passeia sem pressa em tantas ruas percorridas, repletas de jardins, casas de todos tipos, perfumadas com as pétalas trazidas pelo vento, espalhadas pelo chão, povoado pelos pequeninos seres da fauna, praticamente invisíveis, em meio à algumas flores que teimam em brotar entre as pedras. Passado que se faz presente, para suprir as lacunas do hoje, as vezes indescritível.

 

Enquanto isso, os jarros de barro, ressecados pelo tempo, tristes, estáticos, vazios, sobrevivem na esperança de abrigar ao menos uma única flor, ou saciar a sede de uma solitária borboleta, recém-saída do casulo.

À noite, silenciosa no correr das horas, revela o tempo escoando com incrível rapidez.

 

Enquanto isso, braços perdidos, carentes, solitários, sonham com o calor de um abraço capaz de dar sentido à sintonia, tão rara, em meio a um mar de pálidas e frias cobertas, adornadas por paredes vazias, indiferentes a qualquer sentimento.

 

Enquanto isso, bocas sedentas de afeto, de beijos demorados, toque sutis e carinho, contentam-se com raras gotas de ternura, que brotam de esparsos sorrisos. O sacro prazer compartilhado, permitido de se provar entre os seres que se amam, se perde no imaginário, ou no descaso, como se fosse algo pecaminoso, proibido, descartável, diante da pouca importância.

 

Enquanto isso, indiferente ao passar dos anos, corações sonham, fantasiam, desejam, mas em pouco tempo se revelam carentes, tristes e apáticos.

 

Enquanto isso, às vezes bastaria tão pouco para que o ser humano alcançasse a plenitude, a magia e o encanto da paixão correspondida, sentimentos reservados para aqueles que se amam, no plural, porque se o amor não sobrevive sem ser correspondido, jamais trilhará as ruas do alternativo e não prioritário, aquele que se mistura sem se entregar, que não dá importância ao sonhar, tampouco se permite amar.

 

Refletindo sobre isso tudo, podemos nos perguntar no que seríamos melhores.

Porém, as respostas, efetivamente, encontram-se abrigadas no âmago de cada ser humano.

 

Enquanto isso, a vida passa, vai embora sem menos dar tempo para as despedidas, corrida cuja largada se inicia no dia em que nascemos. E, entre o início e o fim, está o meio - a trajetória, o que se vive, se ama, se compartilha, se gosta e se deseja.

 

Seria tudo tão diferente, se as pessoas vez ou outra experimentassem carregar no coração a alma de um poeta.

 

Ah, se fossem poetas pelo menos por um instante, não dariam importância para muitas coisas, se permitiram sonhar, amar e serem amadas com toda a intensidade, sem qualquer tolo e inútil preconceito. Isso reavivaria a esperança, os mais loucos sonhos, o compartilhar do afeto, o carinho e a demonstração do amor, flor maior do breve existir.

 

Enquanto isso, a razão se sobrepõe à emoção, e as pessoas acomodadas nas redes sociais, na facilidade do WhatsApp, e em tantas coisas impalpáveis, seguem sem se darem conta o quanto deixam efetivamente de viver, de amar e serem amadas. desperdiçam o precioso tempo por nada.

 

O mundo real perece, enquanto o virtual cresce assustadoramente, adornado por abraços vazios, sorrisos de plástico, amores que desfilam nas frias telas dos computadores, desejos satisfeitos no imaginário, amores inexistentes, sonhos inacabados, portas cerradas, melancolia e solidão.

 

Enquanto isso...o poeta sonha, divaga, viaja em amores jamais provados, nos loucos sonhos tantas vezes sonhados. E assim, no silêncio da noite que lhe cerca, deixa cair uma lágrima, para que esta chegue até o seu coração, às vezes tão ressequido e carente de afeto.  Ana Stoppa

 

Ana Stoppa
Enviado por Ana Stoppa em 28/04/2023
Código do texto: T7775083
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