O julgamento da História
Não me peça nada além das minhas forças, querida. Igual ao andarilho que não tem parada, nem certeza de chegada, eu, tanto quanto sei, nada sei mais que no minuto seguinte, mesmo que eu não queria, o tempo vai seguir seu rumo. Como vê, nada posso. Como alguém que ignora as razões da existência, ou, talvez, por intuição, prenuncia ações sem conceber as próprias razões, talvez, por intuição ou parentesco com o que de mais sábio tenha tido acesso, talvez, e só talvez, eu saiba que nos próximos trinta minutos o ônibus vai passar. Você ri porque sabe que existe uma placa com o horário, mas e se essa placa não for dessa linha? Como vê, nem tudo que reluz é ouro, diz o sábio ditado popular. Entende que a ordem das coisas consiste em acreditar que tudo se organiza seguindo ordenamentos aceitos por todos, como num contrato, onde cada parte se compromete para que tudo ande conforme o combinado? Entende que qualquer faísca no processo, como um cataclisma, derruba todo edifício passivamente aceito? Nesse sentido, quando Espinoza infere que Deus, ao contrário das Escrituras, que afirmam ser o único Criador e o único com Direito de ajustar o mundo segundo Sua vontade, ao dizer que Deus é a Natureza de todas as coisas, está a dizer que Deus é a Natureza em seu esplendor, em toda sua Essência. Ao fazer essa afirmação o filósofo se pôs diante do tribunal, foi condenado e excomungado. Todavia, onde estão seus algozes? O que se sabe deles além de serem os condenadores de um homem, cujo crime, foi questionar o dogma que dizia ser Deus o único Criador de tudo. Quando esse mesmo homem dizia que Deus é tudo que está na natureza, que Deus é a razão da própria Natureza que é porque é, como Deus, que é porque é. Mas os homens, os sábios homens não entenderam isso. Por que não entenderam?
Fato é: o filósofo é parte fundamente da filosofia, seus algozes, opacas manchas no tabuleiro da História. A mesma coisa acontecerá com os falastrões da nossa história atual. Um fugitivo que teima em espalhar ódio, um ex julgador que envergonha o bom Direito, uma imprensa que, a pretexto de fazer jornalismo, partidariza a notícia e se torna cúmplice da mais abjeta ação contra a Democracia. Onde a história os colocará? Tal qual Espinoza, a Democracia será lembrada, seus algozes...