Besta vaidade
A minha necessidade de você era uma barganha que fiz comigo mesmo; desde que te conheci até o dia que te abandonei.
E na ausência de poesia na minha vida, me aconcheguei na mais besta vaidade, que me transformou num poeta barato, falho e sem graça. Parei de ser criativo, ver ofício nas escritas e preguiça de pensar no seu rosto e nas curvas do teu corpo folheado, manso. Inventei novos lábios, de baixo e sorrisos frios. Inventei nova boca, novos ouvidos, tristes linhas enroladas de cobre, da cor que refletia a mistura do céu e do sol no fim de tarde... Inventei nova cintura, novos olhos de breu silêncio. Inventei você novamente e novamente, até que fingido de dor, esqueci o seu primeiro nome.
Deixei de ser o encanto que inventa a doçura e beleza do gosto doce. E sou o feitiço que ricocheteou e me transformou em ato de ação angustiada. Você não era o real invento? Deixou de ser toda a potência que se desprendia do espírito criador do poeta? Das folhas secas sujando a calçada e do vento que cerceia a voraz prática da limpeza? De tudo isso e todas as palavras que inventei enquanto você calava, restou um limbo de fugaz desprezo do meu estreito coração? Órgão estreito onde não passa nem mesmo uma criatura inventada, daria, sem mentiras, para o nada? Para o sangrar que é falta do Amor fatal! Das respostas que esperei, nenhuma me curou.