O FLAMENGO DO RÁDIO
Por muito tempo o Flamengo não aparecia para mim nas cores rubro-negras. Durante parte da minha infância, o Flamengo era fruto da minha imaginação. Os jogadores não tinham rostos definidos, não eram negros, brancos ou pardos. Todos os chutes a gol pareciam perigosos demais. Respirar num momento desses seria como uma blasfêmia. Aprendi a amar o futebol pelas ondas do rádio. Ao mesmo tempo em que torcia fanaticamente pelo meu time, tinha que usar a imaginação para que o gol de placa fizesse algum sentido para mim. Eu tinha que recriar todo o cenário, os jogadores, a bola e dar vida ao lance. O rádio permitia que eu fosse um menino a brincar com a emoção, fazendo do meu modo. Para o meu coração a imagem mais forte, mais eterna sempre será a do menino, de olhos esbugalhados, diante do aparelho, ouvindo os gols do Flamengo e as peripécias do humor brasileiro. Ali eu não era apenas um menino. Era um ser encantado que havia se apaixonado por um mundo novo, um mundo que eu não sabia que existia.