Nós três e os "inseptos"
Pois não nos víamos há algum tempo, muita saudade e todas as recordações, adoro estes encontros. Depois de semanas combinando, optamos pelo Jardim Botânico de Porto Alegre. Ainda era primavera e nesta terra daqui do fim do mundo, nunca se sabe que tipo de clima vai estar. Precavidamente me armei de meia comprida, botas de cano curto, o meu jeans que nunca irá se apartar de mim e uma blusinha de manga curta, mas esquentou,acho que ferveu. O ideal nestas situações é carregar uma mala com casaco, maiô, manta, sombrinha, guarda-sol e uma boa canga retrô, aqui, nunca se sabe... O Jardim Botânico estava impecável, bem cuidado, o lago da minha adolescência estava meio barrento, mas com chafariz,tartarugas e papiros,eu me senti uma Cleópatra dos pampas ou a mãe de Moisés da Bíblia, no meio das macegas do Nilo. Nós três, ripongas dos anos 70, falantes e inquietas, nunca deixamos de ser jovens, nem deixaremos, amém, e se o "alemão doido" nos pegar, daí vai complicar muito. Entre cesta de piquenique, toalha xadrez e tudo, o tempo voltava,junto vieram formigas, bichinhos voadores estranhos e os mosquitos nos recebiam de asas abertas, mas seria um bom dia. Deixamos para trás nossos "chefes", gato, cachorros,coelho, esquecemos que éramos donas de casa. Nos reunimos na condição de ser "as gurias" do colégio, amado colégio. As gurias e os "inseptos" e que fique muito claro, não existe piquenique sem eles, nunca seria um piquenique de base, de raiz, como diz Cris Pereira, um piquenique bagual. O termo "inseptos" foi criado pela Aurea, que é uma Guimarães Rosa gaúcha e se liga em defesa com panos de pratos. Dia divertido, gratas lembranças, acho que choramos também, eram três vidas e saudade. "Nêque" do nada, começou a esquentar, tirei as botas e fiquei de meia no capim cheio de rosetas,foi um suplício que valeu a pena, só queríamos nos reunir e comemorar alguma coisa que o tempo deixou um pouco distante. Desenterramos memórias engraçadas, lembramos do pessoal da nossa turma do colégio, o qual se mantém unido até hoje e, do nada, a Aurea começou o festival do pano de prato. Aurinha detesta "inseptos", animais marinhos, lagartixas,pisar em areia,pisar na grama e abomina trocinhos voadores que atacam pessoas. Pois pasmem, eu e a Liâni passamos um dia apanhando de pano de prato,cada criatura voadora ou rastejante que passava sobre nós a Aurea nos acertava uma panada, o que não deixou de ser um potente repelente para inseptos. Houve outro encontro,no lago de carpas e sabe-se lá mais o quê, devia ter até jacaré, lontra, misericórdia!Desta vez fomos atacadas por um sol equatorial que deve ter fritado inclusive a metade do nosso cérebro. Sentamos mal, na frente de um bambuzal, tínhamos a certeza de que estávamos protegidas. Soprava um vento brando, devia estar se escamoteando da Argentina para cá, pois rachava o coco e a gente não sentia, o sol nos sapecou a mil, ficamos literalmente torradas, intocáveis e uivantes. Eu fiquei bicolor, metade do rosto e do braço vermelha - puxando para magenta - a Li que estava de bermuda fritou a perna, a Aurea se salvou, não pagou mico. Mas desta outra vez não apanhamos de pano de prato úmido. Estamos programando o terceiro encontro e já resignadas sabemos que vai voar pano de prato para cima de nós.
Aproveito para desejar um ano muito melhor para todos e agradecer a luz do poeta Ansilgus que me despertou. A paz para o mundo!