Meus pés

Meus pés estão fincados agora em Suzano. Especificamente em uma sala fechada, diante de um computador e com demandas cotidianas - burocracias e correrias que fazem com que a gente mais corra do que ande. Por isso acho que meus pés estão cansados. Mas não é só isso. Acho que meus pés estranham não estar de chinelos, ou mesmo descalços. O sapato sufoca. É primavera e tá um pouco quente. E aí parece que eu sinto que esse chão tem algo da repulsa. Não do nojo, mas de que “Esse não é o meu barro”. Por isso, se me perguntam onde está o meu pé, eu sei que ele de alguma forma está em Recife. Está nos meus amigos que o tempo vem distanciando, está nas memórias no lago da Federal e debaixo de um pé de acerola no quintal de casa. Mas ainda tem outro pé. Esse fincado no sertão, debaixo de um juazeiro e de uma memória que pouco a pouco está se perdendo - esses dias descobri que meu avô tem Alzheimer - e as pessoas que me viram bebezinho muitas já se foram. Mas eu sei que algo de mim está lá. Perdido… ou por redescobrir. Tem o riacho onde eu vi um bode chupar manga. Tem a pedra onde um tio meu cagou no outro no jogo de esconde-esconde. Tem a casa antiga que tá só a base. E tem uma tulha de passado que passou sem que eu pudesse abraça-lo.

Não sei para onde eu quero ir. O máximo que sei é que nesse chão que agora piso algumas coisas já me mudaram. Veio a minha esposa. Veio a minha filha. Veio o teatro e a literatura e outras pessoas que vieram e ficaram e até fincaram raízes…

Pensar nos pés como uma fotografia… talvez eu os pense mais como texto. O resto… é devir.