JARDIM SECRETO
Os meus escritos não mudam nada no mundo: a flor não será ainda mais bela porque assim a descrevi nem a imundície humana será menos pútrida porque mencionei o amor. Nada do que faço mudará o mundo, estou aquém desse poder e agradeço deveras por está-lo. Se falo sobre o sol é porque lhe sou grata assim como agradeço por haver passado tudo o quanto porque passei – a ferida arde e ensina algo, mas a cada um cabe a sua dor. Não sei ser eu no mundo dos outros e neste exato instante empenho-me em existir (tal qual me julgo ser) dentro do meu universo.
Há dias em que a melancolia transborda, faz-se côncava entre os olhos exaustos. Nem a profundidade do vazio preenche a si mesmo e tudo parece uma constante omissão daquela suposta alegria contida no alívio do findar. Há dias em que sorrio de dentro para fora e o meu rosto torna-se convidativo, capaz de irmanar-se com os estranhos pelos quais tantas vezes passei sem enxergá-los de fato.
Entretanto, nada disso modifica algo no mundo. Se me julgo estar contente ou entediada, a ninguém compete sabê-lo. Escrevo para mim – sou egoísta, eu sei – todavia, gostaria que alguém soubesse sobre a inconstância das flores no jardim secreto que fiz de mim: nem sempre houve espinhos, nem sempre um colibri...