UM... HABITUDINÁRIO

Quando eu morrer, "quando eu chegar ao outro mundo,

Primeiro quererei beijar" meu pai;

Sorrir pro meu irmão que morreu quando bebê;

Ver os meus avôs maternos que não cheguei a conhecê-los;

Encontrar meus tios, meu primos.

"Depois irei abraçar" uns amigos:

Corrinha Fernandes, Nenira...

"Gostaria - também - de me avistar

Com São Francisco de Assis"

E com São Sebastião

Que foram dois santos de garra!

Um lutou pela paz

E amou os pobres na terra,

O outro serviu na guerra.

Mas, sou tão pequeno, que pretensão!

Não sei se mereço isso tudo.

Isto feito, me prostrarei

Ante a majestática presença de Deus

E me abismarei

Na magnitude absoluta de sua Glória!

E lhe direi que:

Desejei

Fingi

Roubei

Menti

Fui um:

Dissimulado

Ordinário

Dismilinguido:

Habitudinário.

E, remido, me imaginarei

No seu colo de Pai,

"Esquecido para sempre

De todas as delícias,

Dores, perplexidades" deste mundo.

Mas, antes disto, dai-me, ó Pai,

Fazer e deixar aqui um legado!

TEXTO INTERATIVO:

PROGRAMA PARA DEPOIS DE MINHA MORTE

Depois de morto, quando eu chegar ao outro mundo,

Primeiro quererei beijar meus pais, meus irmãos, meus avós, meus tios, meus primos.

Depois irei abraçar longamente uns amigos - Vasconcelos. Ovalle, Mário...

Gostaria ainda de me avistar com o santo Francisco de Assis.

Mas quem sou eu? Não mereço.

Isto feito, me abismarei na contemplação de Deus e de sua glória

Esquecido para sempre de todas as delícias, dores, perplexidades

Desta outra vida de aquém-túmulo.

Autor: Manuel Bandeira foi um poeta, crítico literário e de arte, professor de literatura e tradutor brasileiro.

Francisco Ohannah Oleanna Osannah Galdino
Enviado por Francisco Ohannah Oleanna Osannah Galdino em 17/09/2022
Reeditado em 17/04/2023
Código do texto: T7607635
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