Filosofia passional

Posso encontrar a filosofia nos mais redutos e inóspitos campos do conhecimento, nos mais improváveis e cotidianos, vãos ou indeclináveis. Por isso não é nada mal que eu me debrusse em aspirações tão obstrusas e incertas.

  Não devo pensar em finalidades, se não esta que se apresenta imediatamente, a mera e única finalidade de sentir. Busco no meio da vida aquilo que me for ferramenta para esse fim.

  O estudo da linguagem é ferramenta crucial para sentir e para observar os sentimentos, para a compreensão dos signos, para a verbalização, racionalização dos devaneios mais pretensos e errantes e a ampla compreensão da emoções. O léxico é uma construção que invade a sombra entre o objeto de significação e seu signo verbal representativo.

  No inglês "argument" é uma palavra que serve tanto para o que chamamos no português de "briga" quanto para "argumento". A ausência dessa distinção me parece um jogo linguístico. Que se faz para esclarecer que uma argumentação não tem intenção de ser agressiva?

  A forma como a gente fala do que a gente sente exerce alteração naquilo que a gente sente. O que me leva a pensar que sentir calado seja uma forma das mais puras de observar uma emoção. Calando até mesmo os julgamentos internos que insistem em nomea-las segundo as tão escassas definições que possuimos.  Sentir é um espectro, as palavras são binárias e nos vão entre elas sentimos coisas inomináveis, indizíveis.

Mas eventualmente só descobrimos o que sentimos por meio de representações sintáticas, ou de signos, imagens e sinestesias semiologicas. Por esta razão a arte é um amplo salão perfeito onde a fragilidade fica exposta. Emoções à queima pele, como fraturas acidentadas completamente abertas para pleno publico.

E a isso se dirige todas as minhas ações: sentir.

Compreendo que sentir não seja tão somente empírico, por mais estranha que essa proposição possa parecer. Que seja também, por vezes, ordenado e metódico, por meio de processos racionais. E que seria o amor uma faculdade das capacidades cognitivas, uma área do saber. O amor é um tipo de inteligência.

Pretendo entremelar a filosofia com a minha busca de sentir, dando origem assim à uma filosofia passional.

Das ferramentas para sentir: o estudo da literatura, que pode fazer emergir os secretos amagos da humanidade. Apresenta-nos aos sentimentos dos outros, aquele que não podemos conhecer nem conceber.

Existe um mundo inteiro intransponível, através de um véu que só a poesia pode remover, só a literatura pode descrever.

Fato é que as vicitudes da vida treinam o sentir pelos caminhos que a este foi proposto por uma serie de eventos caóticos. Mas, uma vida dedicada a isso talvez vá conferir ao sentimento uma caracter trancendental, em que ele agirá dentro — e sobre a ponta de suas margens — de seu limite intrínseco.

Mas que eu ignore tanto quanto menos eu puder, que eu toque o mundo com todos os meus olhos, que cada um dos meus sentidos esteja presente no fenômeno da existência, que as possibilidades da experiência possível me devorem como o fogo devora aquilo que se interpoe entre ele e os céus. Que todas as mãos que me tocarem me atravessem.

Lilith_
Enviado por Lilith_ em 26/08/2022
Código do texto: T7591849
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