POENTE

É triste como os poemas são esquecidos, como os versos perdem a conexão e as rimas tornam-se irrelevantes. A beleza – antes rara – presente no olhar, transfigura-se em algo comum. Os detalhes pequenos, quase imperceptíveis, convertem-se em entediantes estranhezas. O encanto cede espaço ao enfado. O veludo das palavras desgasta-se na aspereza da rotina. As manhãs perdem o excitante efeito das descobertas. Dormir transforma-se em fuga. As canções deixam de ser assoviadas. As vozes, sem empolgação, já não contam novas histórias. O lamento é salgado e úmido, mas os olhos insistem em retê-lo por um tempo indeterminado. Alguns sabores enjoam e surpreendem quando se revelam amargos. Sem métricas, sem prosa, sem ruidosas palavras, o silêncio comprime o coração. A poesia da felicidade imprime sua passagem e parte antes que nos atentemos às mudanças da paisagem. A chuva traz a primorosa aparição do arco-íris... Caramelo sorvido lento, mantido embaixo da língua, mas derretido no calor da boca voraz – tudo o que vale a pena, esmorece um dia.