Versos descomprometidos

Quando eu tiver sérios compromissos

com meus versos...provavelmente

essa constante amiga, a poesia,

não me visitará mais...

Será isso uma superstição?

Como aquela de deixar os sapatos

jogados de qualquer jeito pela casa?

Esquecer abertas as portas dos armários?

Varrer a casa de noite?

Deixar de arrumar a cama pela manhã?

Dizer "benza Deus" quando vê uma criança novinha?

Ou outras tantas práticas

que nossas avós nos ensinavam?

Sinto apenas que se engajar meus versos,

totalmente descomprometidos a qualquer obrigação

vou perder o direito de fitar nos olhos a minha amiga

tão fiel de todos os tempos...

Provavelmente não passará mais cedinho em meu quarto

arrancando-me do sono, mas conservando-me o sonho...

Não me surpreenderá como uma aparição de brancas vestes

passando rápida ao meu lado, enquanto faço as contas do mês,

não me conduzirá à janela para observar as nuvens

ou identificar aquele pássaro cantando no telhado...

E como punição severa para minha desatenção

me deixará muito tempo sem o pão e a água da inspiração....

Assim, por mais que eu queira me esforça para compor

versos seriamente comprometidos...não vou conseguir...

Porque me sentirei tão preocupada e sombria

tão repleta de autocríticas, que nem perceberei

quando a minha amiga, de passos leves vier me visitar...

Nem quando tocando os dedos entre meus olhos

vier abrir de mansinho os centros adormecidos

de meu outro olhar.

Mareluz
Enviado por Mareluz em 22/08/2022
Reeditado em 22/08/2022
Código do texto: T7588363
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