DIA DE SOL
O ponteiro vermelho, dos segundos, continua marcando o tempo. O pêndulo, sem vontade e sem náuseas, vai e vem. Tudo transcorre num segundo, num minuto, numa hora, e/ou em um dia. E lá se vai o tempo e a vida. Ele olha para mim. Parece querer me hipnotizar e por vezes sinto sono e não posso dormir. Tenho sim que cantar e chorar, rir e viver, porque o relógio e o sol são os marcadores do meu tempo. No meu teatro não necessito ensaiar e, apenas, dançar. Danço a vida, driblo atropelos, sonho por sonhar e as vezes sonho o sonho real; vigio o mundo por uma fresta, nado kms e retorno sem me molhar; converso longamente com o cosmos e o mar, aprecio as gaivotas sobre a baia e em sua presença canto a canção do meu exílio no meu convexo para o meu côncavo. Há cinco mil anos a nossa estrela maior já fora o marcador do tempo, graças aos gregos. Hoje, o sol brilha e segue a sua trajetória. Pela manhã, muita luz, brilho e muitas cores misturadas ao barulho dos motores dos barcos de pesca e lanchas que cruzam a Baia da Guanabara e, outras atracam no píer próximo ao Forte de São João. À tarde o sol preferiu se esconder para liberar uma enxurrada de lágrimas por sobre a terra. A chuva cai sem pretensão e um martim-pescador pousado em uma das antenas do prédio vizinho, ensopado e quieto, aguarda a sua companheira para se recolher depois de uma longa jornada mergulhando em busca do seu alimento. Sem a luz do sol a minha luz se torna fria, violeta. Esmaece. Nesse momento, ouço o tic-tac do relógio sincronizado pelo vai e vem do pêndulo que marca devaneios, desilusões, concretizações junto a esfera terrestre e o sol segue para Si-Chuan onde o cão ladra à sua espera.