A CIDADE DE PEDRA
A CIDADE DE PEDRA
Depois de muito caminhar cheguei na entrada dela
Sem ornamentos ou letreiros, só o uivo do vento a anunciava
Nada era mais eloquente como apresentação...
Meus joelhos doíam e minhas costas arqueavam
Foi uma longa peregrinação por planícies das mais verdes e também desertos sem fim
Atravessei rios de margens distantes com peixes maiores que eu e lutei como um tártaro por um punhado de carne
Agora terei meu descanso entre os antigos na cidade eterna
Caberei em suas casas sólidas e protetoras
Viverei como um pároco no interior dos seus muros paternais e pregarei para os convertidos numa missa solene e imutável
Sentirei o doce sabor das verdades inquestionáveis que só seus habitantes conhecem e comungam
Farei parte da arquitetura mais bela já erigida e meu semblante também estará fixado na paisagem por aeons longínquos
Cada irmão e irmã residente me dá boas-vindas no mais sonoro silêncio e meu agradecimento é uma reverência
Revejo alguns rostos saudosos, e outros que no passado me causavam náusea agora me parecem plácidos
Sei que viverei enfim a pura democracia e enfim a verdadeira liberdade...
No espaço onde se dissolvem os conflitos e se dispersam as mágoas entre as rochas verticais e as colunas das edificações comuns à todos
Sob as quais dançaremos celebrando o astro-rei e a senhora das marés
Sem volúpia ou febre, sem mais cansaço ou desespero
Gentis, resignados e serenos nos jardins da imensa cidade de pedra que acolhe à todos hora mais hora menos.
(Dedicado ao mestre maior Edgar Allan Poe)