Quietude

Hoje ninguém me viu.

Passei, andei, olhei e até falei, mas ninguém me viu.

Pudera: não estava aqui.

Sorri e me sorriram de volta; mas eu acho que passou por mim. Olharam direto nos meus olhos, mas nada conseguiram enxergar.

Eu não estava aqui.

Hoje até as palavras me escaparam, de mim arredias elas pularam, a frases inacabadas se uniram; a força do motim das ausências reveladoras.

Então hoje tive acesso àquela parte difícil de ser que só se encontra com muito silêncio e concentração. Vi traços que havia esquecido; desenhos borrados mas na pele marcados. Vi passado e renovação.

O autoconhecimento pressupõe retiro. Mergulhei num mar da discrição. Hoje fui puro silêncio.

Hoje-solidão.

Mas eu vi quem passou, vi quem olhou e vi quem falou. Hoje eu vi muito; apesar da boca selada. Numa guinada do destino, a vida de todos me foi escancarada.

Hoje ninguém me viu.

Mas eu vi. E é certo que vi a todos também.

Galvino Moreno
Enviado por Galvino Moreno em 22/07/2022
Código do texto: T7565454
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