My self
As curvas da fumaça do café, os cristais de açúcar sobre a toalha da mesa, a luz da lâmpada que eleva os contornos da sombra de uma madrugada que desagua sobre minha cabeça, o silencio tomado pelo tictac do relógio de ponteiro e os fios de meu cabelo sendo procurados pelos meus dedos como alguém que procura um livro entre os corredores e prateleiras, são os meus dedos procurando os melhores pensamentos. As vezes penso que esse habito me ajuda a pensar. É até engraçado, mas não é bem assim, minhas memorias não tem moradia e não se demoram muito num só lugar.
E o silencio é mesmo uma coisa estranha que dialoga com a gente, e como uma criança pirracenta joga toda a bagunça para a superfície e nos mostra que não somos tão perfeitos assim. Que a aquela fumaça que evaporava do café ganhando formas, somos nós mesmos tentando fugir pelo telhado, pelas brechas das portas e janelas dos dias comuns. E os dias que sorrir é tão caro quanto um dia de folga ou uma sexta feira, até que aquela fumaça desapareça e a gente se lembre que era só mais um pensamento. Um movimento de pêndulo de uma maré que nos convida para dançar e esquecer por alguns instantes dos problemas, dos pragmatismos da existência.
Observando os teus contornos vejo que não es tão bela assim, que a luz te deixou um pouco torta, o tempo te deteriora, desbota tuas cores e tem um cheiro de tempo passado, uma sensação de que já vive aquilo repetidas vezes em um loop que é preciso morrer várias vezes para descobrir que boa parte de minhas escolhas me fizeram adormecer. Aqui de dentro eu não vejo as nuvens, muito menos o vento que as carregam, mas eu sei que existe um céu lá fora, que permanece mesmo nos dias de chuva.
E voltando a falar sobre as minhas memorias,
Como um barco passageiro
Aves migratórias
Já se foram…
Não estão mais no mesmo lugar.