Entrelaçamento
foi naquele instante que compreendi que éramos dois homens. homens, em nossa pulsação acelerada de corpos que se preparam para o entrelaçamento.
e, nesse entrelaçamento, reconheceríamos nossos limites. reconheceríamos nossa dificuldade, nossa inaptidão para o amor da forma como ele nos havia sido ensinado.
e, da incapacidade de encenar um amor idealizado, inventaríamos outro amor. um amor humano, cheio de arestas e incongruências, de texturas, cheio de dúvidas. cheio de mistério.
e, do mistério, inventaríamos uma linguagem secreta, cheia de metáforas e fantasias ambíguas. tudo insinuação, desejo, sede.
e, na medida em que aprendêssemos as novas expressões do idioma secreto com nossas línguas úmidas e quentes... descobriríamos, nas entrelinhas, um prazer indescritível. voraz e veloz na chegada, lento e manso na duração, dilacerante no gozo. rolaríamos de preguiça e êxtase — e deste momento jamais esqueceríamos, até o último dia de nossas vidas, neste mundo tao pequeno e grande, tão odioso e amável.
o exato instante em que uma faísca irrompe no ar da noite, preparando-se para incendiar lavouras inteiras.