O Sapateiro da Abelha Preta
Como todo menino, chorando ele nasceu. Andando? Não; aliás, quem nasce andando! Mas com ele até que poderia ser. Pra andar já ficou. No decurso de sua vida não economizava metro quadrado, ou melhor, hectáres; melhor acostumarmos com esse termo ele o usou incansavelmente, afinal, ele era lavrador. Na Abelha Preta aprendera a arte de sapateiro e se tornara um dos bons. Seu pai era fazendeiro famoso na região da Abelha Preta, mas ele portava-se como servo; o pai nunca lhe dava nada, pelo contrário, só lhe retirava. Sobre isso contarei mais adiante, agora seguimos donde paramos, vamos lá... ahhh, foi aqui. Celas e botas fazia melhor do que todos os excassos sapateiros da região. Talvez fora por isso que ele rumou pras bandas do sul e, como todo bom nordestino, mandou-se para São Paulo. Na verdade não foi para tentar ser o melhor na profissão de sapateiro que ele foi pra SP, haja vista que numa cidade populosa a competição há de ser maior e com ela a "seleção natural" mostra pros fregueses os melhores artesãos dos sapatos. Não, definitivamente, não foi por isso, mas por culpa de Marconi, creditado criador e dono da primeira patente do rádio. O sapateiro, como trabalhador que era, incansável, cabe citar, ajudara seu pai, cabe citar, sozinho, no pagamento de dívidas que poderiam destruir de um dia para outro toda a fazenda da família do sapateiro. Um doze avos! Uma vergonha! Só ele trabalhava, um entre doze irmãos. Contudo, depois desse empreendimento( arranque e carregamento de troncos de árvores com jumentos , logo após, haja braço, serras pra cortar em molde de pranchas) exacerbado e pagamento da dívida, ele, o sapateiro, o lavrador, o madeireiro, pedira ao pai um mísero radinho pra escutar as modinhas sertanejas da época( meados do século XX), o pai lhe confirmou dizendo que traria no próximo sábado. Pois então, chegara o sábado, ansioso como fora de ser durante toda sua vida, o sapateiro espera por seu pai... barburinhos, como por extinto, fora impulsionado para porta de casa. Era seu pai com as compras. Nada de radinho! Desculpas esfarrapadas não foram suficientes para amenizar a dor causada pela ingratidão do pai. Sobre o seu tudo, o pai lhe agraciara com o nada. Sem destino, com uns contos no bolso, partiu para o assentamento dos paus de arara.