Nós e Eles [A Partir da Fome]

Diz-se deles a se devorarem, pelo que conta a história, pelo que se lê sobre a fome que lhes é própria. Como que leões a cercarem de comentários sobre sua ferocidade os tigres, falamos nós e eles de si, cercando-nos de nós mesmo, deles

a nos defenderem. Pelo que do mundo os quatro cantos sabe-se deles estão em constância a se classificarem como presas e caçadores, mesmo que de mesma genética e concentração, espremem-se aos sucos em suas substâncias venenosas e nas massas fermentam tão somente o quanto são obrigados, sem toque de avó, sem segredo de afeto. Reconhecem o recheio uns dos outros, nós e eles, pela cor da cobertura. Deles é extrapolado que se observe raro demais partir aquele

que parta o bolo na busca de conhecer novas nuances, novos sabores de ser humano. Sabe-se ainda daqueles que repetem tipicamente os mesmos pratos de seus antepassados sem que conheçam a cozinha mundial, sem que se visitem em caldeirões de fervilhar não a ponto de engoli-los, mas a ponto de temperá-los, misturá-los, decorá-los como iguarias contemporâneas. Parece que ouviu-se falar daqueles que matam sua fome a agregar alimento ao alheio, diz-se desses, de

nós e eles, como estranha tribo que projeta-se a caminhar faminta há séculos e mais séculos, buscando do alimentar a troca, diz-se ainda deles ser lamentável que estejam pelo globo espalhados, são eles diferentes continentes prontos a culminar numa esfera de maior harmonia, que põe-se a nutrir-se de seus próprios elementos, no que em um se perde o outro aparece a outra vez instituir-lhe. Dos que não encontram alimento conhece-se muito aqueles que desabam em se

consumir, por daí distinguem-se em dois grupos: dos tão sedentos por repartirem o que neles sobra como de vida mantimento que partem-se em si em dos órgãos os mais vitais, tais consomem-se portanto em cabeça e coração, com elevada carga de fogo e luz, implodem-se na procura por dos desertos os outros sedentos, de suas forças extremas nasce-lhes o cansaço letal. Do outro grupo diz-se daqueles que consomem-se no que extraem do alheio e num acúmulo do que não lhes é próprio explodem junto ao ambiente, comumente levando vidas outras já usurpadas em seus alimentos consigo. Diagnóstico é que de todos os tais grupos não se pode dizer que vivam em escassez de recursos pra que suas vidas sejam mantidas, bem como nutridas, espalhadas, desenvolvidas, largas e resistentes, porém pede-se mais campos pra que se replantem e se contemplem a crescer, pede-se que brotem um a um e um aos demais e todos os outros juntamente pra que a terra faça-se um tracejado uniforme, que sejam então os próprios indivíduos, nós e eles, nós somente carga e descarga, transporte e possibilidade, chão, chuva e colheita.