Incendeia
Você foi fogo que chegou incendiando tudo que havia em mim. Não bateu na porta, nem utilizou de nenhum tipo de educação. Não perguntou se eu estava disponível ou se existia espaço aqui dentro para você fazer morada. Seus olhos chamuscavam, era uma mistura de curiosidade e excitação, parecia está se divertindo com a confusão que eu transparecia. Você exalava perigo, e mesmo todos os meus sentidos me alertando para manter uma distância segura, eu, por impulso e insanidade inalava você, me aproximava de você. Nossos encontros antes casuais foram tornando-se intencionais, às vezes por você e admito, por mim também. Se nos encontrávamos, faiscava e eu temia que se nos tocássemos haveria uma combustão. Foram dias de troca de olhares, semanas de cumprimentos formais, para apenas um mês depois teus dedos frios tocarem em minha pele, e de forma contraditória queimarem toda minha sensatez. Foi apenas um toque, seguido de um beijo lento e profundo para incender, para acender e transformar esse desejo inteiro que nos consumia em um prazer real.
Inicialmente, éramos um puro desejo carnal, estávamos em pólos diferentes de um imã que geravam uma atração assustadora e surreal, era um êxtase corpóreo que nos influenciava a nos encontrarmos cada vez mais. Porém, com o crescente número de momentos juntos despertaram-se sentimentos antes inexistentes para nós, que eram fortificados a cada conversa, a cada chocolate com canela que dividíamos nos dias frios. Os filmes que víamos juntos eram pretextos para mais encontros, onde fingíamos interesse para utilizarmos dessa oportunidade para nos beijarmos, inflamávamos a cada segundo. Não existia relacionamento, não existia posse. Eram apenas duas pessoas que ao andar juntos, uniam um dedo, uma representação tão simples de sentimento que era capaz de me desnortear. Não existiam rótulos, eram apenas eu e você explorando esse mundo de sentimentos desordenados, mas que pareciam corretos.
Quando percebi, na cabeceira da minha cama tinham os teus livros favoritos e na terceira gaveta do meu guarda-roupa, peças suas. Nossas escovas de dente dançavam juntas no banheiro, assim como nós dois, enquanto ouvíamos alguma música com batidas um pouco mais agitadas. Estar perto de você não era confortável, era turbulento e enlouquecedor, não existia calmaria, mas eu gostava de sentir cada emoção que você me proporcionava. Seu sorriso era audacioso, contudo, convidativo e eu me perdia nele, me perdia em você. Mas, em uma quarta-feira, acordei sozinha na cama, olhei para os lados e não havia o cheiro do perfume amadeirado que você tanto gostava, já havia sumido do travesseiro. Não senti o aroma de café na cozinha que você costumava fazer todas as manhãs, pois era a sua prioridade ao acordar. Não existiam roupas no chão, nem aquela calça de moletom velha que você tanto gostava. Tudo sumiu, você se foi. Então era isso, simplesmente acabou, éramos juntos brasa acesa e quando o fogo cessou, sobraram apenas cinzas no chão, que foram levadas pelo vento separadas. Mas mesmo após tanto tempo, me pergunto se um dia elas poderiam se reencontrar.