Poeira cósmica

Houve um tempo em que você inspirava meus escritos. Hoje é o contrário. Eles inspiram você, que só existe quando os leio. Está cada vez mais parecido com meus devaneios, enquanto sua versão real se perdeu na memória. Seu fantasma é feito tão somente de palavras. Se eu te encontrasse outra vez, não sei se te reconheceria. Seríamos estranhos um para o outro, e suspeito que sempre tenhamos sido. Queria te conhecer, mas talvez acabei te inventando. Eu não me arrependo, mas às vezes acho que deveria me arrepender. Opção 1: de ter dado espaço para essa fantasia em minha cabeça. Opção 2: de ter destruído qualquer possibilidade de tornar isso real. Provavelmente nosso reencontro seria como achar o corpo já sem vida de alguém desaparecido há muito tempo. O tipo de resposta que não é solução. Só serve para dar fim às esperanças do resultado que nunca virá: está vivo e bem. Eu já nem me iludo mais, mas é que reler as palavras soa quase como um feitiço que te faz aparecer por um instante demasiado breve. Uma máquina do tempo que me leva de volta a esse universo paralelo que criei. Hoje, entretanto, não passaríamos de poeira cósmica.

14/02/2022