A CONTA-GOTAS, NUM VOO VESPERTINO

Hoje, ao cair da tarde, nós voávamos juntos.

Eu ali, serpenteando os arranha-céus da cidade num voo raso de gente e ele, algo instintivamente assustado, seguia a procurar pelo seu habitat sumido, em meio ao cinza brilhante da cidade.

Éramos como dois seres sem céu a tomar fôlego num ar viciado.

De repente, paramos para descansar das rotas suadas, sempre interceptadas pelo inesperado dos tempos.

Enquanto ele olhava para o alto, sem nada entender, eu, aliviada, deduzia comigo mesma: " que bom que ele nunca saberá o que eu já sei- embora ambos passarinhos- o quão pequeninos e insignificantes são os nossos voos diante do poderio daqueles que tudo compram; exceto o prazer de se poder turbinar as asas para sobrevoar todos os obstáculos intransponíveis.

De repente, ele cantou a traçar seu novo ziguezaguear de possibilidades, a me levar nas suas asas alvissareiras...

Focamos o horizonte.

A noite caía do céu a conta-gotas e juntos alçamos voo para o amanhã que prometia sonhos.

E que já bem próximo dali nos aguardava, a nos desenhar novas rotas de infinita e inegociável liberdade.

Mavi em

13.02.2022