PROSA DO NÃO-VIVER

Eu quero muito passar pano pra alguém que viva de verdade...

Eu quero demais ver cores no céu como um louco de ácido e colecionar borboletas vivas como um hippie

Eu quero acordar da vida e viver num sonho vívido até o loop infinito acabar

Eu realmente quero ser tragado por uma canção suave como o despertar de um milionário em férias

Eu quero ter pagas minhas dívidas com as pessoas que se apiedaram de mim e da minha condição tão peculiar

Eu quis tambem verter lágrimas quando tudo ruiu e foram feitos barracões pra abrigar os desesperados e famintos

Mas não consegui...

Eu quero ainda perdão pela minha truculência fora de hora e meu gosto pelo vento

Eu queria de verdade que fossem plantadas flores no meu jardim quando todas as crianças viessem brincar nele

Eu quis assim uma lembrança de um tempo que ainda não veio e pelo qual sempre esperei

Eu ainda quero meu playground com terra no último dia das férias escolares

Mas a estação mudou, a feira acabou e todos os palhaços foram pra casa contar os trocados ganhos

E eu continuei querendo ser um asteróide suicida ou um residente do lado escuro da Lua

Ainda assim minha vontade permaneceu pura e incólume...

Mesmo quando as estrelas morreram e o céu ficou cinza na metade de maio

Eu quero ser como o poeta que chora rindo por palavras e destila graça através do fel do mundo

Eu quero, ainda quero muito.