VOLTAS EM MIM

Queria estar voltando agora de um lugar vazio de mim. Queria uma volta sem tantas voltas, que não me deixassem tonto, enjoado. Queria uma montanha-russa, não importa a nacionalidade, contanto que não desse voltas. Somente a vertigem de uma queda imprevista. Queria um retiro voluntário, que não me trouxesse de volta, sempre e tão logo. Como se para fugir precisasse estar mais presente. Como se ao esconder-me, me mostrasse mais que o recomendado. Abro os braços, abraço o vazio que me completa, e então desejo o nada, e isso me basta por fugazes momentos que nunca se perpetuarão. Volto a mim, desperto, ainda sonolento de uma cômoda letargia. Não posso sair pela rua com os cabelos desgrenhados, com a boca amarga das palavras não ditas. Se tenho que encarar o espelho sem remédio, devo faze-lo brevemente e sem dor, sem fitar-me diretamente nos olhos. Amo a vida, sou vida, quero a vida como a uma mãe salvadora de apuros, mas hoje o sol me aborrece. Preferia que a mim não se apresentassem ruas, rostos nem pessoas. Antes a ausência das palavras. Antes o silêncio que em mim reverberava idéias. Só por hoje. Somente até que essa claridade irritante se ponha. Somente até que em mim brilhe de novo o sol. O dia. A luz.