Não sou cônscio, concebo
Toda a natureza me parece tão certa como o mistério certo da superfície; o toque da musa e o dedo da criação, que se apresenta em proporções por vezes conhecidas, sempre apontando para o mesmo, o desconhecido; o mistério tão certo a cada pergunta. Não há nada que me der a certeza de que estou a caminhar, nada há ali ou aqui, nada há que não seja o mesmo, esta renúncia dúbia do mistério que é tudo. Não, não acredito em nada, sequer em mim e só por não acreditar faço o mínimo possível, mesmo parecendo que há esforço, não, não há, não há nada além de um ir como um minímo necessário para não me afortunarem com suas boas novas. Por vezes tentei e quase dei o meu melhor, mas me vi por ridículo, que é o que sou. Não, não posso dizer isto a todos ou me apregoar como norma, sequer defendo normas, quanto mais à mim. Não há ninguém além de sombras, sim, sombras é o que vejo e não há ninguém além de minha consciência ou o que chamo de tal, mesmo não sabendo o que venha a ser de fato, assim como tudo, ou melhor, nada. Não, não me ensinem geometria, simetrias e demonstrações, eu só tenho a mim ao final de toda explanação, no final do dia. Se queres por mim passar, deixe-me voar entre teus cabelos, unhas e mãos, se queres por mim me entregue a paz, me der a minha solidão, aquela que é minha por direito ou por obséquio de um desgraçado. Não, não me encontro em nada e só por não me encontrar em nada passo por tudo e apenas por passar por tudo me vejo como nada, como nada de tudo; como um nada que é tudo e disto não se pode negar, nem sequer desarraigar desta concepção de si como um nada, jaz pois ser-tudo. Não me prendam a sistemas, conceituações, oh céus, conceituações! Não me expliquem ontologia, não me venham com dialéticas, não, não me venham com o utilitarismo em prol da ''verdade'' disfarçado de ética. Me venham com o nada, pois só assim podem vim a me dar o tudo que podem. Por favor me deem um copo d'água! Há dias que não tomo água, a minha hidratação se faz por café, ah me deem também pão, algum que possa vim a degustar, que venha a degustar ou no mínimo, engolir. Não sinto prazer mais em nada, nada, ohh... nada. Me salvem de mim, de mim salvem, alguém? Alguém? Algum humano nesta terra? Algum homem que entenda minha miséria de inventar uma tal que não tem nome? Alguém que entenda que não estou mais na dialética do ser e do não-ser, mas o da água, a água que tudo se mostrou ao ler e ler? Apenas, desejo descansar, mas o desejo, o tal desejo que não é, és em mim e em ti uma ilusão, assim como tudo e nada, assim como viver, resta-nos apenas esta sensação tão certa (?) de sofrer, ou direi, de mim sofrer; não sei, não sei e isto é tudo.