Tempestade de verão
Somos uma sociedade de pessoas com notória infelicidade: solidão, ansiedade, depressão, destruição, dependência; pessoas que ficam felizes quando matam o tempo que foi tão difícil conquistar.
- Erich Fromm
Sufocante.
É assim que me sinto, vivendo sobre uma pele que muitas vezes, não reconheço como minha. A quanto tempo deixei de ser quem eu sou?
Tarefas. Sempre tarefas.
Sempre algo para fazer, uma meta a cumprir, um caminho a planejar, um objetivo a concluir. Por que minha mente nunca descansa?
Três dias sem fome, três noites de gula. Distúrbios alimentares não são piores que os da alma. A ansiedade deixa marcas piores do que costelas e estrias a mostra.
Respirar fundo. Focar a mente. Sorrir.
Estou bem. Já faz semanas que estou tranquila, nada me a abala.
Prova na terça. E lá vamos nós.
Respira fundo, você consegue. Um pouco de insônia aqui, apertões no braço aqui e pronto! Ninguém notou. Passei no teste. O plano segue inabalado.
Vozes. Sentimentos. Por que nunca me deixam em paz? Por que meu peito dói, e eu não consigo respirar? Como pedir ajuda se não consigo gritar? Meus pulsos tremem, são 16:30 da tarde e meus pais vão estar em casa logo. Será que vão acreditar se virem? Vão perguntar o porquê do meu choro? Não, tudo bem. Eu me viro. Sempre dou um jeito.
Agora sinto que vai ser diferente.
Estou lendo livros de autoajuda. Quem disse que ansiedade não pode se curar sozinha? Vai ver nem era isso, eu sempre exagero um pouco mesmo. Qualquer adolescente se estressa. Eu sei disso.
Lágrimas, garganta fechada e pulsação forte. Abaixar a cabeça, não deixar ninguém ver. Aperto as unhas nas palmas. Acalme-se.
Respiro fundo. Por que estou tão nervosa? Por que esse sentimento voltou? Todos sempre me olharam assim? Estou fazendo vocês sentirem pena? Desculpe, eu não queria incomodar. Por favor não chame ninguém.
Dias ruins. A cama parece mais agradável, meus olhos estão sempre sensíveis e quero chorar o tempo todo. Não quero levantar. Não consigo levantar. Meus pés estão pesados, e eu tenho tanto a fazer. Não tenho escolha. Respiro fundo. Dois comprimidos devem ser o suficiente.
Sorrio. Sempre sorria, é importante para os outros.
Quando esse pesadelo irá acabar?
Dias ruins, dias bons. Posso contar sobre eles? Posso falar sobre meus pesadelos? Não, não. Besteira. Não é tão sério assim.
Ardência no peito. Está piorando, e eu não sei o que fazer. Alguém pode me ajudar? O que eu fiz de errado? Respiro fundo. Você consegue, você já fez isso antes.
Mais apertões. Três comprimidos dessa vez, nada com o que se preocupar.
Minha mãe me viu hoje. Será que ela percebeu? Será que se perguntou o que pode estar acontecendo comigo? Será que vai ficar decepcionada se eu disse que não sei? Que na verdade, está tudo acontecendo e ao mesmo tempo não existe nada?
Pensamentos, pensamentos.
Sempre muitos pensamentos. Por que não consigo deixar para lá?
A ansiedade me consome. Chega quando eu menos espero, arranca tudo de ordem, transforma minha mente em um tornado, sem o menor motivo ou explicação. Vai embora do mesmo jeito que chegou.
Como uma tempestade de verão.
Rápida, sem aviso prévio e com estragos alarmantes.
Meu havaí mental.
Dias de angústia. Uma sensação que percorre meu corpo dos pés a cabeça. Sempre uma preocupação. Relaxar? Ficar tranquila? Como? Perguntas e mais perguntas, vou acabar enlouquecendo de vez.
Mais comprimidos. Vai ficar tudo bem, eu só preciso descansar.
Acordo doze horas depois. Remédios realmente ajudam? Meu corpo parece gelatina. Meu rosto possuem olheiras, mas tudo bem, nada que uma maquiagem não resolva.
Um festa. Rostos desconhecidos, risadas abafadas. Por que eu não consigo ser leve e tranquila assim? Sorrio. Estou gostando, está tudo bem. Ah não. Dor no peito. Preciso respirar. Por favor saiam da frente. Controle-se.
Muita gente, muito barulho. Por favor fiquem quietos; Não consigo pensar, não consigo não pensar. Lágrimas. A tempestade voltou.
Tremo. A quanto tempo estou nesse lugar? Alguém me viu? Causei transtorno? Espero que não. Tudo sempre dá errado, sussurra a vozinha no fundo da minha mente. É culpa sua, ela diz.
Deve estar certa. Eu não me controlei o suficiente.
Respiro fundo. Eu consigo. Já fiz antes, posso fazer de novo.
Engulo seco, limpo o canto dos olhos. Sorrio. É importante.