No bus
Houveram enrascadas que a gente sustentava por um sentimento, mesmo de momento. Mas sustentava. Na sensação. Numas rendia noutras não. Vinha, na ocasião, cheia a vida, as coisas, os caminhos, a idas e vindas. Naquele idem, o dia era de pegar estrada, comboio, arroio, molho. Viajar. Dia santo, santificado. Coisa menos de sagração mais de obrigação, quinta-feira santa.
Havia de voltar e voltava. Na estação rodoviária. Na hora da partida. No sentido, o passo pulado ao olhar da surpresa, ela, bela. Espera precipita a urgência. Dei no passo, passei, vi, fiz que nem. Mas vi. Já queria tanto que no cacho amadurecia. Ônibus lotado, carregado de personas desligadas. Descarga de não energia, sonoterapia. A aglomeração é alheia, só. Toca e toca a procurar um lugar para pousar. Troca perna, troca olhar, troca ombro e escombro, troca cheiro e pandeiro. Pronto, não de pronto, mas no ponto, o lugar. Dois. Um com desconto. Era para o destino, digo, era para o menino, digo, uma epifania. Claro, para ela, a bela. A mina. Só hoje, a minha menina. Veja o jornal sobre o banco, é a estratégia. Ela vinha, lá vinha, já vinha, chegando, chegando, ando. Ei, aqui tem lugar. Please. Seu sorriso se desprendia da moldura retinta de ternura. Isso até o sol jura. Acomodou-se. A seu modo, cheia de jeito. Sob uma pequena nuvem de flores silvestres. Na densidade do perfume. Leve. Leve recordo. A corda solta e escapamos pelo planalto, como sentinelas que se esquecem. Caiu cada vez mais leve sobre meu ombro, adormecendo, adormecida, bela. Um encanto. Um fado. Encanto de fada. Pode? Caminho tem metade, momento. Teve. Ela, repleta, olhares abrindo e sedosos. Eu, explícito, olhares medrosos, compridos. Outro sorriso, sem aviso, a mágica, o toque. A vida começa quando explode a célula nova. Na suficiência do abraço. Da flor colhida em maço.