Passado
Plantei pomar, fiz sementeira e plantei cacau.
Molhei, reguei, fiz cova e adubei, plantei.
Joguei adubo, joguei calcário, curei formiga.
Podei, cavei buraco de estaca, de mourão, estaquei.
Bati arame farpado, arame liso, fiz cerca e fiz curral.
Limpei terreiro e limpei quintal.
Andei e corri a pé, fui andarilho, fui corredor.
Corri também a troco de motor:
De bicicleta, moto, carro, trem, navio e avião.
Montei em jegue, em burro, em cavalo,
Cansava, deitava, dormia e de pronto estava de pé.
Ponguei em trem e viajei também.
Em jipe, em caminhão, de marinete, de ônibus e de avião.
Andei nas nuvens, nos trilhos, no asfalto, na estrada de chão.
Andei na vereda, em trilha, em caminho, em calçamento, em cidade e no mato,
De dia e de noite, também no asfalto.
Rapei mandioca, passei no rodicho, puxei roda, fiz farinha e fiz beiju.
Tomei banho de rio, de lagoa e de mar, dava salto mortal, pulava, mergulhava, aprendi a nadar.
Fiz estrada, fiz planta, fiz casa e fiz pomar.
Criei, gato, cachorro, cobra e preá.
Criei coelho, saruê e tamanduá.
Galo, galinha, pinto, peru e cocá.
Vi ema, seriema, avestruz e carcará.
Viajei, passeei por perto e por longe em muito lugar.
Fiz fojo, fiz gaiola, fiz alçapão, fiz arapuca, fiz laço de correr e de açoitar.
Atirei de bodoque, de espingarda e de pistola.
Usei faca, usei facão, estilete e canivete.
Chupei manga, mangaba, chupei goiaba e seriguela.
Chupei tudo que foi fruta que vc imaginar.
Subi em coqueiros, mangueiras, abacateiros e araçá.
Parti coco, parti ouricuri, parti dendê e indaiá.
Brinquei de peão, de triângulo, de gude, de esconder, de patinete e de carrinho de rolimã.
De empurrar e de arrastar, ladeira acima, ladeira abaixo não parava de brincar.
Pulei macaco, subi em coqueiros, em árvores, tirei jaca desci na corda, no dente e na mão.
Brinquei de Tarzan, de índio, de esconder e de achar.
Brinquei de bola, gol a gol, de bobinho, de cascudo e de chutar.
De bola de meia, bexiga de boi, da borracha, de plástico, de camurça e de couro.
Pulei corda, bati pandeiro, tambor, violão, brinquei de roda e de cantar.
Estudei, trabalhei, li livros até formar.
Tive medo, tive coragem, tudo de arrepiar.
Morei, me mudei pra muito lugar.
Da choupana a prédios, no interior, na capital.
Morei em quarto, kit-net, sobrado e patamar.
Joguei bola, fui zagueiro, fui atacante, fiz gol de tudo quanto é lugar.
De fora, de dentro, do meio de campo, de falta, de pênalti, de cabeça ou de chutar.
De direita, de esquerda, de joelho, de barriga e de calcanhar.
Só não fui goleiro, nem gandula, mas cansei de arbitrar.
Joguei na grama, no cascalho, no calçamento, no sintético, na praia e no areal.
No meio de tocos, de pedras, até em cima de lajedo cheguei a jogar.
Ajudei grande, ajudei pequeno, botei gente pra trabalhar.
Dirigi carro, montei em moto, aprendi a pilotar.
Almocei, jantei, comi em tudo quanto é lugar.
De dia e de noite, em casa, no restaurante, no hotel e no bar.
Tomei café com pão, manteiga não, comi beiju, tapioca, cuscuz e saborá.
Comi dendê, broto de mandacaru, de beldroega, bredo maturi de caju, castanha e ouricuri, coco, rapadura e araruta de raspar.
Bebi coca cola, fratelli vita, crush, cajuína, grapete e guaraná.
Trabalhei, me dediquei, suei, me estafei, pra lá e pra cá.
Trabalhei em pé, sentado, correndo, deitado, dormindo e acordado.
Trabalhei de facão, de foice, estrovenga, de enxada, enxadeta, roçadeira, moto serra, picareta e enxadão.
Montei bicicleta, carreguei feira em carro de mão.
Dormi, sonhei, tive pesadelo, acordei, viajei por tanto lugar, parei e me pus a pensar.
Logo veio a inspiração e eu escrevi este poema para de tudo eu me lembrar.
Com certeza ficou um monte de coisa deixada prá lá.
Por enquanto são só estas que eu queria contar.
Por Augusto Bello Filho
Brasília 18/10/2018.