O andarilho

E eis que fez surgir, naquele deserto de almas, e cheio de homens, em tudo, iguais aos mais horrendos dos seres, a esperança, e, em certa medida, a crença de que ainda havia a possibilidade de se entregar ao próximo como se fosse o último dos seres.

Não disse mais. Saiu, como quem sai sem rumo, porém, sabe, que tão logo ache a água que saciará a sede, dela beberá com gratidão. E certo que, depois dele, outros virão porque de outros ele veio, nessa caminhada, iniciada por pés mais antigos, segue as pegadas registradas ao longo dos tempos. E assim fez. Assim tem sido.

Igual a tantos outros, ele, como quem sabe que nada sabe em demasia, por isso, está sempre a aprender, ele, como um andarilho, anda pelo mundo como o viajante que, sem parada certa, ou companhia convidada, quando o cansaço se apresenta e o corpo já não consegue resistir, senta-se e espera o próximo passo. Calmo e sereno, paciente

e atento.

Acostumado a falar como se falasse a todos amigos, desde que aprendeu a conhecer os homens e suas fraquezas, o andarilho, em tudo apenas dono do caminho que traça, avança como se buscasse, ainda que sem consciência certa do que seja, a preciosa joia; que de tão simples é a mais bela.

Não era pessoa abastada. Nascera de pai operário e mãe lavadeira. Todavia, como se a honestidade, ela própria, fosse, em si, uma entidade sagrada, fato é, e por todos conhecida, que àquela humilde família, honestidade era a pedra fundante da prole. Assim foi; assim se perpetuou o valioso ensinamento. Ensinamento transmitido como o DNA responsável por nossas características recebidas dos nossos país e mães.

Ciente das dificuldades que a vida impõe, desde que se fez sabedor - ainda que sem elaboração vernacular pomposa - que a existência só se realiza na mesma medida e proporção quando se mira o devir, sem o desejo excessivo dos Reis e seus arroubos superiores. Não. Definitivamente, não. A ele, esses arroubos de superioridade eram sinais de alguma fraqueza, alguma questão sem solução que - como a poeira que se atira para debaixo do tapete - estava ali guardada, trancafiada no mais recôndito de suas entranhas

Aos homens, para os homens e com os homens, não divisa nada, ao contrário, tudo deve ser feito para aproximar. Assim, o andarilho, como quem, a cada passo que dá, como a semente que se deita à terra, o andarilho semeia sorrisos, abraços e amigos.