Saudade de Minha Terra

Por Nemilson Vieira de Morais (*)

SAUDADE sua, é mato que não raleia… Lembranças que não saem, centelhas que incendeia.

— Me ponho a lembrar…

Do entardecer, do cantar do galo no amanhecer. Das batidas da cancela no mourão; do som do chocalho, do mugido do gado na pastagem; deitado a remoer.

SAUDADE do luar do sertão, que à terra toda prateia, de um passado distante que o pensamento campeia...

Meus pés ganharam o caminho, ao frescor da memória a impactar meu sentir…

Ruas, estradas, trilhos, atalhos, encruzilhadas… dão-me a esperança e a poeira. — A converter a cor dos meus calçados, em pó esbranquiçado; nos passos que já dei.

Carrego comigo a SAUDADE da minha gente: mãe, pai, irmãos, amigos, moradores do lugar. — De acontecimentos memoráveis; das pessoas, que, o meu coração se pôs a amar, e a mente correu longe a lembrar…

— Do seu Joaquim Batista (Quincão), ao andar, em calmaria, pelas ruas num passo meditativo, em dedo de prosa a um amigo, no percurso que fazia. — Sempre com as mãos pelos bolsos, ao chegar devagar, nas rodas de conversas e sair como veio: calado, sem se despedir.

— Do Cafubira a tecer suas redes de pesca, a contar suas histórias de pescador...

— Do Congo de Ouro (militar da reserva?), a lembrar e falar do seu passado de glória na Força Pública, dos atos de bravuras, de honras recebidas… dos desafios da vida.

Congo, ao ser preso, fiz uns versos sobre ele, a prisão. — Ao saber não gostou, nem um pouco, mas, passou... Fui salvo por um gongo.

— Do Bira de Maninho, com os seus gracejos,  trejeitos e imitações do jeito de falar do mineiro, num humorismo nato.

— Do seu Inação com os seus causos, a fazer seu cigarro de fumo goiano. Picar o bruto com canivete, na mão. Depois o agasalhar na palha seca de milho, cuidadosamente selecionada e lambida, para o fechamento.

SAUDADE da turma do “gole”: Penteado, Aristeu, Crispim, Pedro Gambá, Bilu Teteia, Zé Melado, João Rolinha, Barrão…

— Dos pássaros…

O Bem-ti-vi parecia dizer, ao cantar, que bem me via; depois da coleta nos céus, engolia seus besouros, insetos.

— Do Gavião-penacho, piem, faminto no agarrar da presa, a voar, feliz da vida, ao conduzir seu troféu à mesa: pinto fresco, nas garras.

— Das andorinhas que iam e vinham, em bandos, num revoo, em torno da praça central da minha cidade.

Se abrigavam no prédio da prefeitura local e no antigo templo católico. Por lá construíam os seus ninhos, cuidavam das suas proles.

Sujavam a paróquia com seus inscrementos: o saguão, dos primeiros bancos, ao altar, mas mereciam o perdão.

— Dos tucanos, com enormes bicos, que, ao pousarem nas árvores altas, entortavam as cabeças, nos viam lá embaixo.

No caminho deles ovos e filhotes de pássaros nos ninhos, não ficavam: comiam-os sem misericórdia.

— Das araras, que, em pares, ao voarem comunicavam-se, o tempo todo nos ares entre si; indo aos buritizais ou retornando deles ao repouso…

— Dos ariscos tico-ticos, rolinhas caldo-de-feijão e fogo-apagou, amavam os quintais e às estradas. Pelas areias dos caminhos, nas coletas de pedrinhaas, deixavam os seus rastros a assumirem de vistas. — Nos galhos das árvores, em cânticos dolentes, chamavam a chuva.

— No tempo das mangas, do milho-verde nas roças, os periquitos, as maritacas em bandos, faziam algazarras na grande festa do ano, em mangueiras e milharais…

SAUDADE de tudo, das árvores, seus frutos:

mangubas, mangabas, do tamboril, do jatobá, dos cajueiros, buritis da minha infância; do pequizeiro em flor, do cheiro que exalava; da pimenta-de-macaco que nós, humanos-meninos comíamos.

SAUDADE da Vila Baiana (onde fui criado), do brejo, da biquinha, de todo aquele espaço (hoje suprimido), do farfalhar da suas palhas ao vento, do centenário buritizeiro de lá. — A reinar absoluto.

SAUDADE do articum do cerrado, feijão-de-corda, andu, farinha sertaneja torrada, mucunzá, paçoca de anta, carne de sol de Juá…

— Da Maria Benta e seu espetacular tempero… Lá de casa: da comida farta, dos familiares em volta da mesa.

— Dos cajuzinhos rupestres, das primeiras águas; do subir a Serra das Almas, do Morro da Cruz; do sangue-de-cristo dos campos…

SAUDADE, de tudo e de todos; até do que não vivi no lugar: dos pioneiros da antiga cidade…

Das compras em Barreiras, que se faziam em lombos dos animais e a pé; da velha tropa de burros de Xavier...

SAUDADE dessa cidade, do seu espírito acolhedor, solidário, com que um dia nos acolheu…

Assim, posso confirmar que, com Campos Belos, sua história, sua gente, temos mesmo um recíproco caso de amor.

*Nemilson Vieira de Morais

Gestor Ambiental/ Acadêmico Literário (29:03:19).

Nemilson Vieira de Morais
Enviado por Nemilson Vieira de Morais em 11/11/2021
Reeditado em 20/06/2024
Código do texto: T7383512
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