Nada
Ah Fernando Pessoa, quem depois de tu ousou tão bem versos escrever? Quem depois de tu ousou em proficiência, sem ciência que não seja contígua ao ser, escrever tão fluídos versos? Nada há depois de ti que não te faria escrever versos, talvez a vida pensada seja uma batalha de acúmulo de derrotas, uma causa perdida, talvez depois de ti, nada, nem antes, tão somente hoje, já que há tantos acúmulos. Desfoques e não sou e não há nada que a linguagem não nuble, desvirtue o pretenso saber, ainda que não seja sofisma. Nestes versos caminhos, nada tenho, nada sou, além disto e tudo externo a mim, que me dizem em vetores o que seguir, nada dizem que não saiba, nada sou, e tudo se assemelha a um grito de uma mãe, mesmo que não haja, haverá sempre os mitos e os ditos serão sempre vistos; retumbam em dissonâncias micro atômicas e de nada adianta, a criança não ouve, mesmo tendo ele quebrado a cara, nada fazem além de fazer, não, não esta simplória dicotomia que é inexistente, meu ser obtuso sente que o que não ver, ver o que não sente e tudo é neblina quando não é seu ser. Ah Pessoa, esse ser que não é, que tanto diz e nada é, confundem a tantos e a nós, a nós, nada. Confluências de aparente homogeneidade, os versos, as analíticas, os filósofos, bem sei eu, tão certo a incertitude e tão incerto a certeza do enunciado, menos tautológico e a priori, talvez a priori, não sei... Talvez a essência que há em cada ser, seja o seu movimento natural, a inércia do não variado, do não esforço, a monotonia de quem faz o que faz, como lodo que nasce no pântano de um sonho sem saber se o nasce e o que é nascer. Quando sonho, tanto sonho, aonde foram os meus referenciais? Não sei a partir de quando sonho, ao menos se o quando importa, nada certo em sonho, mas sonho em tudo. E nestes sonhos vejo-me a escrever versos, em uma altivez de nada, em um sonho do impossível, em uma ânsia desgraçada. Sou um filho desarraigado de si por uma incerteza em promessas, por uma promessa que nunca chega; queria eu não ter nascido, o figurado em imagens e analogias de nada dizem, queria eu não ter simbólico, escrever estes versos para quê? Para não viver, viver desvivendo, sorrir em sonhos, chorar em vida, morrer em tudo? Não, não há irascível, não há pessimismo, apenas um tédio que me abarca em espaços difíceis à visualização. Nada e mesmo não sendo nada me parece que não seja outro além do que veementemente e inutilmente místicos em códigos tentaram transpor, seria eu um? Não, não sou nada e neste nada que não me defino, pois a implicação formal no real há? Ou de nada importa, a não ser o sentir em outros e tantos outros que julgam sentir em outro? Não responderei se o nada na sentença algo significativo diz, se o significado não nos diz nada, que esperamos nós? Que dizer é o que nos diz? Por que nos diz? Penso que tudo está errado em definições, pois fazem-se como tal e se moldam ao desejar do dizer; penso e já não mais, pois não há nada morfológico, sintático, lógico, e semântico que nos diga algo que nos prenda em um algo, que é fora, os nominais que são dentro, ou o nada de tudo isto que é mais dentro do que fora. Nada sou e nada penso, não há força aplicada que cause em mim variação de ser, não há nada em mim além da espécie de ser, que é nada. Nada é em tudo e sinto-me indisposto e indigente quanto a tudo, como um refluxo do vazio. Tédio, sobretudo o que sinto é tédio e muito mais ao que poderia associar, mas não há nada além de fome e sede, o que sinto sobretudo é fome e sede, o que sinto é uma forte sensação de vácuo que me dilui, dissolve-me em consciência do nada e entre trilhões de estrelas sento-me em nada e perco-me em tudo, apenas não sei se é um reencontro, mas sinto um alívio frente a toda batalha, uma aceitação catártica de tudo; perco-me e aceito a derrocada, deste nada perco e venço.