Bença pai!

Nunca bebeu. Nunca fumou. Trabalhava para si. Trabalhava para outros. Trabalhava. Quase de domingo a domingo. Na roça, não se deixa de ter algo para fazer todos os dias. Tirava leite, capinava, roçava, plantava, colhia. Chegava em casa tarde, às vezes, à noite. Chegava com seu cheiro de capim, de curral ou de brejo. Cheiro de dignidade, sempre.

Chegava e cuidava ainda de algumas coisas no curral, ou preparava algo para as criações. Depois entrava, tomava seu banho, jantava, e após uma pausa para descansar, chamava para rezar o terço. Este chamado, para nós, em criança ou adolescência, significava muitas vezes ter que parar uma brincadeira, parar de ler um livro ou ter que desligar a tv. Logo, um chamado às vezes chato. Mas era a hora de todos juntos na mesma sala, a calcular de quem era a vez de tirar o terço.

Quem “tirava” o terço, o fazia ajoelhado. Tradições que ninguém perguntava o motivo de ser assim. Mas era também, no antes e no depois do terço, que se conversava em família, se lavava roupa suja ou se algazarrava em conversas cheias de risos, muitas vezes, de zoação. A espiritualidade, então, se expandia no tempo, adentrava noite afora, e percebo hoje, que não estava contido no último amém o fim da oração, mas, na bença que se pedia a pai e mãe, um pouco mais tarde, antes do deitar.

E “nessa vida, cumprida à sol”, papai (não, não é um mimo literário, é assim que citamos entre nós irmãos, mesmo depois de crescidos – a mamãe e o papai), ainda que com seus mais de 50 de idade, depois do curral e do trato da criação, tirava um tempo para brincar de futebol, jogar baralho, ou de alguma outra forma, ser presença entre nós.

Meu pai, assim como minha mãe, que não saberiam se perguntados, fiéis à brandura dessa gente do campo, responder o que é um mestrado, um doutorado, ainda assim indicaram os caminhos. Coube-lhes a sabedoria desses mestres, que sabem formatar o coração, os sentimentos, a fé, a índole, o caráter e a disposição. Valeu amigo velho!

Já já me deito, e bateu essa saudade de poder pedir uma vez mais: bença pai!