NO MOSTEIRO SÃO BENTO
Mosteiro São Bento, sob a luz pouca, quase penumbra, escrevo. Os sinos lá fora badalam quartos de hora (deve ser um quarto para as quinze horas).
Venho aqui sempre para me abrigar do barulho perturbador desta São Paulo que não sabe calar. Gosto deste mosteiro: a luz pouca, os vitrais, as pinturas, a escultura interior. As inscrições em latim nos pórticos... Estou dentro do silêncio.
À minha direita há um vitral em tons verde-claro, pastel, cinza, roxo, azul claro, vermelho, amarelo... A luz o atravessa e ele se ilumina: as cores acendem luz verde, roxo, vermelho, pastel, amarelo, cinza, azul, e o transforma em lâmpada acesa vertical encravada na parede. As suas figuras vivem e se movimentam dentro da luz de que são feitas. Seus gestos se expandem, avançam para fora do vitral. É tudo tão requintado e rico de expressão que eu até me entristeço diante dessa beleza que há no ser humano. Se ele pode criar algo tão bonito é porque dentro dele essa beleza há. E fico pensando que um dom assim perde-se muitas vezes em desvãos. Tudo que é belo é tão inútil e perigoso. Essa inutilidade do belo é que nos dá essa sensação de grandeza e liberdade. O mergulho nessa inutilidade é que nos leva ao perigo, perigo de existir só para o inútil e o belo. Se estou possuída de beleza, estou possuída de liberdade, e isso é estar em perigo.
E olha o que está escrito abaixo dessa pintura vitral:
STANS IN ORATORIO DELECTVS DOMINI BENEDICTVS CORPORE ET SANGUINE DOMINICO MVNITVS INTER DISCIPVLORVM MANVS
O relógio bate as três horas. Vou embora. Já não sei mais nada dizer. Não quero mais escrever. Dói.