Bem aventurados os que veem

Bem aventurados aqueles que conseguiram ir além do que nos veste; porque respeita a ilusão que as vestimentas representam e sabe que além delas mora a verdade; sabe que mesmo, ambas, morando nas casas do efêmero, trafegam sobre as mesmas, ciente da fonte;

Por traz de cada manto, vestido ou tecido a encobrir o corpo, mora o calar das vozes e o silenciar da palavra; e toda aquela gravura que deforma, é descartada, põe à vista a poupa, e dela autoriza-se a prova;

Provar do gosto ambíguo das paragens da alma e sorver o amargo, ciente de que é dela todos os sabores da travessia, não é coragem nem covardia, é sina, é traçado antes, e sentido bem depois do intento de saber ou retornar; e somente assim, então, sorrir;

E mesmo diante de rijos, todos os músculos da face, em repulsa no beber da seiva, não se perde o trago e nem o tempo de sorvê-la; já que se espalhou por todas as papilas, saborear é o que não se pode, mas se faz para cumprir com o sussurro soprado entre as orelhas, decidindo-se pelo que sussurra; e o que te impulsiona, o que leva, calado te toma, te põe à marcha;

E serão poucos os que pedirão do outro cálice; na dúvida e por não verem o professor, verterão sobre os pés, para que escorra ao chão, o suposto ácido que por ventura arderia a língua; ignotos do mel que se desperdiça, o mesmo, ao lamber a terra, a fertiliza em retorno; para quem sabe em outra visita, poder desta taça embriagar-se, até a lúcida presença de um olhar, realmente novo ou renascido;

Bem aventurados os atrevidos que souberam que era deles, toda a ação livre e não se permitiu moldar por aquelas paredes perfeitas, disfarçadas de plenitude; viveu seus atrevimentos, provou sem gosto e com gosto, de todo o cálice e não desperdiçou tempo em beber das escolhas retraídas ou temerosas do estreito apego que o controle lhe oferece;

Quis da estreiteza seu aperto até não sobrar mais uma partícula de ar em seus pulmões para então, cair naquela amplitude sem vista horizontal ou vertical e nisso, soltar-se em honra ao que lhe ensinou todos os limites, erros, fracassos, medos - todos os renegados; e os que foram aceitos, já não são plateia, já não se encontram mais, foram em partida não quista, mas foram para sustentarem estes, renegados;

Os espaços em vazio infinito se abrem, os ruídos se calam e a vista já não se detém no adiante; os olhos são pássaros que pousam junto aos sons que se multiplicam por dentro e em canção harmônica, saudando aquilo que não se atreve restringir na palavra sem alcance; mas estão lá cada uma delas, todas as faces, em seu lugar e também, seus adversos;

Cada vão, cada gota vivida... um universo desbrava-se nele ou naquele, bem aventurado que vai além daquilo que nos cobre o corpo. Toda veste é necessária, mas são delas a natureza de se desgastarem primeiro para que se veja; então, bem aventurados os que veem!

Kátia de Souza - 22/06/2021

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