O MARULHAR DAS MARÉS
A Poesia retrata belezas em tudo aquilo que a digital do Criador concedeu voz e hálito.
Tempo feio aqui no sul do mundo: frio, chuvas e ventos. O marulho nas pedras, o cântico da chuva sobre as dunas, o soturno cicio do vento sobre os meus cabelos revoltos. O humilde vício de cantar traduz-se em solilóquios.
Alguns sábios afirmam que a vida é esse conjunto de sensações de espanto por estar vivo. São lindas as lições cotidianas provindas da resoluta anima do Absoluto em tudo o que Ele criou, apalpou ou tangenciou com a natural leveza da abstração.
Todavia, é necessário ter acuidade para o incomum olhar: ver em profundidade, competência para avaliar e dimensionar com sagacidade o encanto de viver. O recantar das marés da Poesia alimenta pupilas castiças nos olhos gastos.
Pobre deste meu inquieto espírito, todo areia revoluteada pela água – fonte maior da vida – que se espraia ao horizonte entre morros e céu, no constante nascer e morrer do sol sobre o lençol hídrico.
Quando flui o estado de Poesia há sempre uma turbidez impregnada de sangue, uma dimensão quase física ao rumor de artérias pejadas de desejos insatisfeitos, sonhos, anseios, enfim, a farsa irônica das noviças esperanças.
O Absoluto em nós nunca dorme.
MONCKS, Joaquim. A MAÇÃ NA CRUZ. Obra inédita, 2022.
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