Borges

Os olhos quando embriagados de cegueira tornam a sentir as cores pelo espelho da tristeza. Os olhos cegos só veem beleza. Enxergam o vermelho mais vermelho da centelha, o branco e o simples canto da sereia. Os cegos podem enxergar a ceia. Jorge Luis Borges, sentado ao canto das estrofes, escreve como quem fareja. Borges inventa, movimenta e esbraveja. Fura os próprios olhos e uma criança adentra, se achega, e ele de fronte à noite a vê como afeita. A criança invade a certeza. Borges se vê no espelho. Escreve de todo jeito. O velho se depara às cegas, à criança cega, se depara a si. Borges não tem olhos e escreve. Soletra. Borges derrete. Ao escândalo, à verdade, à invenção. O argentino cego é um labirinto. É uma fábula. Borges é uma tradição.