Inocência à deriva

Vento forte que bate e exaure minha inocência que é tão fulcral nos dias atuais, como nas vezes que as folhas amontoadas em união compartilharam do calor reconfortante que é o coletivo. O sopro glacial dos ventos é tão devastador que nos mostra que certos comportamentos são queimaduras gélidas de muitos anos atrás. O menino que era para ser correto, desandou; o garoto calado hoje não sabe coligar suas emoções com sua língua; o tão querido garotinho afável e carismático da família não é mais capaz de responder com tenacidade os ataques que a vida dá.

Os processos inconscientes deliberam o que somos e o que seremos por toda a vida. O inconsciente é o pai que joga às duras verdades para a criança, enquanto ela chora e o desconjura mesmo tendo a senciência da realidade. A mãe é o consciente harmonioso com si e com o coletivo, que sabe enquanto permanecermos em carne, ainda temos uma nova chance de recomeçar. Talvez isso seja o infortúnio que me desalentou com a existência. Talvez meu pai tenha agredido ignominiosamente minha mãe, e ela tenha chorado e rompido o seu relacionamento com meu pai. O que restou a mim, mera criança girando em sua utopia? Virei órfão na vida. Detesto meu pai e desanimei da minha mãe. Este sangue coagulando em meu cérebro, a incerteza e o desamparo em sua impura dualidade se conheceram. Se casaram e tiveram um filho: a angústia. Quem diria… agora tenho um irmãozinho. Infelizmente esta família também não me ama, assim como meus verdadeiros progenitores também não. Novamente, o que resta a pobre criança distópica que já não gira mais? Sem esperança, sem família e desamparada? Tentei a psicologia, mas como o esperado, ela me deu conceitos e não soluções. Tentei a meditação de sábios monges, como praxe, não deu resultados. Esqueci que meu cérebro, que já não é mais útil, não para um milissegundo sequer para relaxar. Ele vai como os carros a 90 km/h que não param para ajudar um pedestre que busca ajuda. Diria que meus pensamentos são como os locomotivos em estradas e minha atenção é o suicida da ponte Golden Gate. Por mais que o suicida queira um mínimo de amor, os locomotivos já não se importam com os lamentos de outrem. Caso se importem, não conseguirão cortar o nervo central da anatomia melancólica do suicida.

A escrita me ajuda a digladiar com gárgulas interiores, só que nessa batalha a minha espada está quase quebrando, está trincada. As gárgulas me queimam novamente, como a dor demasiada gelada do vento que levou a minha pureza. Não sei até quando posso suportar.