Até onde a poesia alcança?
É fácil o pensamento ir para um lugar comum, um lugar-ideia já conhecido com aparência de seguro, um lugar supostamente sob controle onde "rua" rima com "lua" e "nua"; onde "colibris cantam" e os "sentires" e os "amares" nos "inversos" mais escondem que revelam e não correspondem a pessoas de carne e osso ou à vida como ela é em seus próprios termos.
Esse caminho do "pensamento fácil", o pensamento condicionado chamado senso comum, embora corriqueiro, pode ser reflexo do vício das rotinas que nos soterram; ou simplesmente preguiça de ver e pensar por ângulos novos.
É comum pensar que a poesia expressa beleza e delicadeza, sentimentos nobres, estados elevados do espírito humano ou o "trivial que nos distrai". A poesia também é isso, mas não só.
Então não faz parte da vida os temas que esforçamos para esquecer? Como a poesia trata, por exemplo, o suicídio e o estupro, o genocídio e o aquecimento global? A poesia faz vista grossa para a morte do gari que traficava cocaína para manter seu vício no crack ou a morte do leiteiro tomado por ladrão enquanto trabalhava na madrugada?
Quanto a mim, não separo poesia da realidade por mais escrota que ela se apresente. Onde a vida acontece, as mãos da Musa estarão vibrantes, tocando e preservando, denunciando e promovendo a essência da nossa humanidade nos meandros da existência.