A SAUDADE EM PROSA
"Dos dedos que presentearam com anéis outros dedos, presenteados agora são com dedos cruzados."
- O que acontecera, Corpo, foi inevitável, saiba que não há culpa ou culpado, amada ou amado, há somente vidas que se desencontraram...
- Já chega. Mente, sei que muito do que lhe peço é o avesso do que quero, mas as centelhas que nosso atrito libera, liberam a certeza que os atritos poluiram, muda até os rostos das mulheres que observo comigo...
- Não adianta, Poeta, tu que na arrogância e orgulho das palavras, se deita sobre belos versos, jamais entenderá a dor que carrego. Meus pés cansaram de correr, olhos doem de chorar, meus punhos não param de tremer, meu peito dói ao respirar. Podes achar que me deixo levar, que a vida é isso, aquilo, blá, blá, blá, entretanto, quem primeiro sentiu os dedos naqueles caracóis ruivos, fui eu.
- Poeta, é como o Corpo disse, mais que espectador, menos que figurante, teu papel nesta tragicomédia romântica é se não, estorvar o elenco sobre suas péssimas atuações. É difícil me conter, eu tento me calar como se tentasse gritar mais alto que os gritos ecoantes do nome dela, se te vale de algo, esse tal valor que pedes que eu conheça não diminui a intensidade daquele rosto em meus sonhos. Muito menos afeta a necessidade que sinto de achar seu rosto em qualquer mulher de cabelos encaracolados. Podes achar que primeiro escreveste sobre seus cabelos, mas antes de vê-los, eu os idealizei.
- Corpo, Mente, só me ignorem então. Se tudo que falo carece de cauda e cabeça é porque esta serpente que vejo não tem cauda ou cabeça. Estou preso em nossas fantasias tanto quanto vocês, agora vejo, mas nada mudo se nela me jogo, mesmo sabendo da hipocrisia que é escrever sobre novos amores quando ainda estamos emaranhados naqueles caxos ruivos...