Ser poeta é ser escravo
Olhar atento, capta detalhes, minúcias. Dedilha compulsivamente sua máquina, fazendo nascer ali sentimentos descritos. São dedilhados escravos, sim! Nada o faz parar, senão a sofreguidão de não poder mais dizer. Acaba ali, findado está. Morreu a inspiração para nascer a obra. Mãos à obra novamente. Observa o que normalmente não se olha. Busca palavras para a erupção que cada detalhe observado escorra por entre as veredas do mais profundo ser e finque suas garras nas linhas datilografadas, marcadas feito cicatriz no papel.
Sente prazer ao ver o nada sutil toque na folha, cravando firmemente suas letras, com a respiração ofegante quando escorre a folha para cima e inicia todo processo. Teso, sente correr o frenesi corpo afora, como quem chega ao ápice íntimo: satisfeito, as palavras escorrem pela folha... Tantas inspirações para esse orgasmo literário: a lua, a flor, a dama, os pássaros, os toques. Memórias ou desejos, os mais sagrados ou os mais profanos. Há aquele ou aquela que, por mais relutante que seja, se dobra ao ver o que o poeta é capaz de descrever no auge da sua insanidade. Sim, insanidade! Ou você, em plenas faculdades, descreveria as minúcias do teu sentimento para ficar refém de alguém? É isso que o poeta é: refém dos seus sentimentos, escravo dos seus dedilhados e responsável por seu ímpeto inconsequente que é escrever. Seu inferno é seu paraíso. Seu paraíso é seu inferno.
Ser poeta é saber ser escravo de si, de seus dedos miseráveis que insistem em escrever, seja com tinteiro e pena ou caneta e papel; máquina de escrever ou essa coisa moderna que nos rouba a métrica, a forma ou rima. Ainda assim, poeta sou. Escravo miserável dos meus inundantes sentimentos, no qual insisto em me afogar. Não dá pra fugir... E nem quero!