O CANTO DO ACAUÃ
No púlpito dos teus seios
Assentei-me e com sofreguidão os beijei
Fonte láctea uterina de minha memória
Ali por entre escombros me escondia
E tua afável fonte cristalina suguei...
E me destes forma quando me desnudei
Me destes vida quando chorei
Me destas a humanidade
Quando meus pés
Começaram a sentir a força da gravidade
Quando pesei senti que os passos
Que deixei para trás agora
Fazem novas pegadas
No monte do meu destino
Tudo recomeça e novamente sou menino...
Quantas braçadas até o útero de tua piscina
Pra respirar o ar da vida
Mergulhei por entre milhões
E aqui cheguei
Passado no formão do teu futuro
Enquanto dentro de você ainda eu era um sonho....
Meu Deus que mundo é esse????
Pelas mãos de outros cheguei
E chequei que pela mãos de outros
Tantos e tantos enterrarei....
Na terra barroca e oca dentro de mim
Minúsculos seres
Agora donos de teus ósculos e músculos
Cavernosos sulcos
Assim vão-se sumindo e tudo se rechaça
Dos meus minúsculos neurônios
Até se apagarem todos
Luz por luz naquela praça
Ora tão resplandecente
Com o sorriso cálido dos teus dentes
E as pombas ao redor farfalhando
E as árvores murmurando sussurros
E tudo isso vão-se sumindo como pegadas na praia
Que a onda vem e leva na lava de borbulhas que desmaia
Como um giz no quadro escuro
Cujo pó do entendimento se esboroa e some...
Qual escondida arraia neste mar mortuário sem nome...
E vai e vem
Esta sanfona é a cantilena do destino
É a mesma chamada
Que na igreja o pulmão do sino
Toca chamando as horas da missa
É a mesma que das horas mortuárias se despede...
E o sino tagarela que qual garganta fecha a glote submissa...
Como um pássaro agourento
O canto da acauã
Que anuncia um profundo lamento
Pro povo lá do sertão...
Eis que agora neste mundo meu corpo viceja
Há quantas horas ainda terei
Nesta imensa peleja
Ainda nesta seca minha água na boca brotarei
Neste verbo que se fez carne seca
Até onde minhas pegadas de alpargatas no chão agreste deixarei
Sem saber que rumo irei tomar
Isso se o rumo não me tomar antes
Pois que todo dia há de um pouco me levar
Embora o mar tendo bons ventos pertença ao comandante...
Terras distantes aqui me trouxeram
Talvez nas fronhas de minha mãe
Aquele tecido adiposo de suas entranhas
Fosse meu quartel e minha prisão
Mais como nada é para sempre
Quando um novo dia com seus naipes surgem
Muitos valetes já se foram e eis que
Muitos nos levaram ou nos lavaram em suas lágrimas
O clarão da vida é morte certa
Veio a circuncisão do monte Sião
Em cada célula uma libélula libertária
Em cada grão pisado uma costela de Adão
Covas casulos de ossos ancestrais
O último beijo da terra embrionária
Um punhado de palavras que se cala...Mudo!
A voltagem estacionária o avesso
O fim ou o recomeço de tudo?...